Hoje em dia é extremamente comum vermos a banalização do consumo de certas drogas, como o álcool ou a maconha, que inclusive está sendo legalizada em alguns países. Tal banalização não começou agora, vem se desenvolvendo há anos e, sem dúvidas, gera uma série de conseqüências para a sociedade e, principalmente, para o usuário. Porém, quais seriam elas?
Este é um cenário que diversos especialistas no mundo inteiro buscam entender. No caso da maconha, um grupo deles, liderados pela pesquisadora Yvonne Terry-McElrath, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, analisou padrões de consumo de aproximadamente 10.000 usuários de cannabis participantes do estudo “Monitorando o Futuro”, do Instituto Nacional sobre Abuso de Drogas dos Estados Unidos. Estes usuários relataram suas experiências com drogas dos 18 aos 50 anos, a partir de 1976.
A principal conclusão a que chegaram é que o uso de maconha está relacionado ao desenvolvimento de problemas de saúde no decorrer da vida, em comparação com quem não consome a droga. Os pesquisadores identificaram duas categorias principais de usuários: uso moderado (71% dos participantes) e uso abusivo (29%). Estas categorias resultaram em um total de seis subdivisões, que vão do “uso decrescente ou interrompido aos 21/22 anos” até “uso abusivo e contínuo aos 50 anos”.
Com os dados em mãos, os estudiosos concluíram que todos os padrões de uso estavam associados com atendimentos psiquiátricos recentes ou problemas psiquiátricos até os 50 anos. Além disso, os resultados indicaram que os padrões de uso persistentes estavam relacionados a dificuldades cognitivas dos usuários, doenças físicas e problemas com uso de álcool até os 50 anos.
Os pesquisadores indicam que, apesar de não ser possível afirmar que a maconha necessariamente seja a causa dos problemas de saúde dos usuários, existe uma correlação com o fato, pois, dentre os participantes, os que fizeram uso persistente da droga reportaram níveis maiores de problemas de saúde. Tais dados permaneceram mesmo após a aplicação de controles demográficos e de características comportamentais.
O que é importante notarmos é que esse estudo compreende períodos que contavam com políticas de proibição ao consumo de drogas. Imagine agora o quadro com o consumo de mais substâncias sendo liberado, como está acontecendo em diversos estados americanos com a cannabis? Com certeza nesses locais existe o risco do consumo de maconha tornar-se similar ao de álcool, por exemplo, trazendo consigo todas as consequências negativas tão conhecidas pela sociedade e também pela medicina.
Estes e outros estudos nos fazem questionar se a atual corrente em busca da legalização das drogas lida com a questão do uso de substâncias psicoativas da forma correta. Não apenas da maconha, do álcool também. Tal pergunta deve ser feita, afinal, o tema do Dia Mundial da Saúde (07/04) deste ano foi “Saúde para todas e todos. Em todos os lugares”.
A promoção de saúde não é apenas a oferta de tratamento – ela passa pela prevenção também. Ao defenderem a legalização de mais uma droga, os representantes de governos estão realmente ofertando “saúde para todas e todos”? Não estariam eles ignorando o exemplo do tabaco e do álcool, substâncias legalizadas que provocam dependência química, transtornos mentais e físicos? Os prejuízos causados apenas por estas duas drogas à vida dos usuários e também ao sistema de saúde pública são monumentais!
Existem inúmeros exemplos de como lidar com o assunto realmente em prol da saúde da população. Recentemente falei aqui no blog sobre o exemplo dado ao mundo pela Islândia, mas não precisamos ir tão longe.
Em São Paulo, temos a primeira rede estadual de tratamento de dependentes químicos do Brasil, o Programa Recomeço, que busca lidar com a questão da dependência química em diversas frentes, com mais de 3 mil vagas disponíveis de maneira totalmente gratuita à população.
O tema do Dia Mundial da Saúde de 2018 é muito pertinente quando pensamos nestes assuntos. O papel dos governantes e também de nós, especialistas em saúde, é garantir que a promoção de saúde, prevenção e tratamento cheguem a todos. Para isso, é preciso questionar: o que realmente atende aos interesses do país e de seus habitantes? Dependendo da resposta, não há mal algum em corrigir o rumo, buscando o melhor para todos.