A assombração da inflação volta a apavorar os brasileiros. O IBGE divulgou, no último dia 11, a inflação de 2021. Medida pela variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), ficou em 10,06%, como já previa a maioria dos analistas econômicos, bancos, casas de análises e consultorias econômicas. Muito acima da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional que era de 3,75%, com margens de variação para baixo (2,25%) ou para cima (5,25%). Desde 2015, quando a variação do IPCA foi de 10,67%, o país não convivia com inflação de dois dígitos.
O estouro da meta de inflação obriga o presidente do Banco Central, Roberto de Campos Neto, a explicar publicamente, por meio de carta dirigida ao Ministro da Economia e ao Conselho Monetário Nacional, as razões do descumprimento. A determinação legal foi cumprida na tarde da mesma terça feira que foram divulgados os dados. Fez muito malabarismo para jogar a culpa no choque internacional de inflação (fenômeno global, segunda a carta), elevação dos preços de commodities e “…elevadas incertezas políticas e fiscais”.
Leia Também:
– Crescimento das receitas dos estados
– Perspectivas econômicas para 2022
– Inflação e crescimento em 2022
– Retração econômica e inflação
– O estrago econômico da Covid-1
– Condições para o crescimento
– A expansão econômica de Mato Grosso
– Mercado de capitais e crescimento
– A montanha que pariu o rato
– Saneamento e saúde
– Educação financeira nas empresas
-Finanças públicas na pandemia
-Ajuda financeira a estados e municípios
-Cavalo de pau econômico
-Perspectivas econômicas para 2020
-Mais municípios, menos Brasília
-O day after da nova previdência
-MT e o acordo Mercosul-União Européia
-Mais Mato Grosso, menos Brasília
-Danos comerciais das queimadas
A disparada da inflação teve, sim, impulsos externos, provocados pela pandemia da covid-19. Como a generalizada alta dos preços de bens industriais, afetados pela ruptura das cadeias de suprimentos, desarranjo das cadeias globais de logística e desvalorização de moedas nacionais, tornando a inflação um fenômeno mundial, que afetou todas economias desenvolvidas e emergentes. Essa onda de aumento de custos da oferta de bens e serviços levou países europeus, asiáticos e Estados Unidos a enfrentarem índices de inflação tão elevados como não se registrava a mais de trinta anos. A inflação externa chega em nós por meio da taxa cambial e alta dos preços das commodities que oneram os insumos, componentes eletrônicos e bens intermediários importados que, por vez, aumentam o custo de produção dos bens industriais locais.
Somados aos vetores externos, internamente, os sucessivos e conhecidos erros de política econômica e as incertezas políticas cuidaram de piorar o cenário nacional, fazendo com que o Brasil registrasse, em 2021, a quarta maior inflação do mundo, ficando atrás apenas da Argentina, Turquia e Paquistão. Os grandes “puxadores” da inflação foram os combustíveis (gasolina, diesel, etanol, gás), energia elétrica, transportes, alimentos, artigos de residência, construção civil e vestuário. A atual política de preços da Petrobras, que estabelece paridade com a variação do dólar americano e preços internacionais do barril de petróleo, responde pela maior parte da inflação.
Ao longo de 2021, a gasolina teve variação de 47,49%, o diesel 46,04%, o etanol de 62,23% e o gás de cozinha 36,99%. Forçada pela escassez hídrica, a energia elétrica variou 21,21%.A mudança de hábitos de consumo contribuiu para a alta de produtos eletrônicos domésticos e da construção civil. As famílias, impossibilitadas de gastar com viagens, lazer, restaurantes, turismo, consumiram mais bens na residência e fizeram adaptações para o trabalho em casa.
As projeções para a inflação de 2022 são de 5,5%. Não vejo com tanto otimismo essa possibilidade. Ao contrário, entendo que será muito desafiadora a tarefa do Banco Central de trazer a inflação para a meta de 3,5%. Mesmo tendo aumentado a taxa de juros de 2% para 9,25%, o banco não viu arrefecer a inflação e o câmbio não alterou quase nada, permanecendo em R$ 5,60. O câmbio menos apreciado ajudaria a frear os reajustes dos preços dos combustíveis e poderia derrubar um pouco os preços dos bens industriais que importam insumos e componentes. As elevadas incertezas políticas e fiscais atuam contra a valorização do real frente ao dólar. Ademais, a perspectiva do Fed (banco central americano) antecipar a elevação de juros coloca pressão sobre as moedas de países emergentes, como o Brasil. Enfim, os mesmos fatores que pressionaram a inflação no ano passado continuarão atuando com a mesma força em 2022: combustíveis, alimentos, energia elétrica, bens industriais e transportes. A propósito, a Petrobras reajustou novamente ontem (12) os preços da gasolina e diesel. Já havia reajustado o preço do gás de cozinha no início de janeiro.
O carregamento estatístico do último trimestre de 2021 impulsiona a inflação nos dois trimestres de 2022, deixando apenas o segundo semestre para redução forte dos preços por meio do aumento da taxa de juros, que deve chegar a 11,75% em março. A necessidade de baixar a inflação leva os dirigentes do Banco Central a uma verdadeira “escolha de Sofia”: elevar o tom das medidas de combate à inflação e levar o país a uma nova recessão, ou afrouxar para alavancar o crescimento e perder o controle dos preços, deteriorando ainda mais as expectativas do mercado e de investidores.
*VIVALDO LOPES DIAS é professor e economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP
E-MAIL: vivaldo@uol.com.br
CONTATO: www.facebook.com/vivaldolopes