Houvesse apenas um óbito e já seria motivo para todo nosso respeito e lamentação. Assim, considerar como notícia auspiciosa as 54 mortes de brasileiros pelo covid-9 de sábado para o domingo passado, só faz sentido tendo como referência os 73, 60 e 58 óbitos dos dias imediatamente anteriores, ou se em relação à taxa de crescimento diário do total de mortos que chegou aos surpreendentes 12,5% neste mesmo fim de semana, muito inferior à série também decrescente de 20%, 20% e 24% dos dias anteriores.
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Não sou especialista na área, porém como um dos bilhões de habitantes do planeta angustiados com esta pandemia, e como um septuagenário em aparente gozo de minhas faculdades mentais, aqui de minha quarentena absoluta de quase 20 dias, penso ter o direito de compartilhar esta fresta de esperança vislumbrada nos números deste último fim de semana. Esperança pode até não passar de uma quimera e se esvanecer antes mesmo deste artigo ser publicado. Contudo sempre traz uma perspectiva de ser real. E a ela me agarro hoje.
Algo de novo e bom estaria acontecendo, mas que por razões desconhecidas os donos do mundo não querem fazer chegar ao conhecimento dos reles mortais? Por exemplo, o sempre eficiente e hoje famoso remédio para malária, a hidroxicloroquina, em parceria ou não com sua amiga cujo nome não lembro, estaria vencendo o terrível corona?
Em uma tragédia com previsão de centenas de milhares de mortos é no mínimo estranho que de vários lugares do mundo cheguem relatos de experiências bem sucedidas da aplicação desse remédio setentão que nem eu, mas que não é liberado pelas autoridades pois faltariam estudos comprobatórios de sua eficiência e riscos. É muita moagem!
Aliás, obrigado em quarentena a ficar ligado nas notícias da internet quase o dia inteiro, jamais vi qualquer notícia desabonadora do tal remédio. Só favoráveis. Ainda bem que o medicamento vem sendo usado no mundo todo. Numa hora destas, diante da decisão médica entre a vida e a morte concretas, às favas os protocolos.
Dizem que, de fato, por traz desta moagem enroladora estariam interesses comerciais, políticos e até ideológicos, incompatíveis com a grave situação que vivemos, já com quase 1.000 mortos por dia no mundo.
De fato, a impressão que fica é que as ciências da saúde foram pegas de calças curtas e não estavam preparadas para enfrentar uma pandemia como esta, embora as pandemias venham se sucedendo com frequência crescente. As posições dos cientistas se contradizem em inconclusivos debates, assim como entre órgãos supranacionais, nacionais e internos aos países.
Um dia é uma coisa, outro dia é outra. Parece que na falta de um tratamento claro para o assunto, a discussão permanente entre cientistas, políticos e autoridades governamentais é a melhor solução, e daí, qualquer pretexto é válido: vida ou economia, curva alta ou baixa, quarentena “horizontal” ou “vertical” (e agora a “diagonal”), de quem é a culpa? qual a nacionalidade do vírus? Enquanto isso o povo é mantido entretido e se dá tempo para que o vírus seja derrotado pelo próprio cansaço.
Preto claro ou cinza escuro? Se não fosse a mesma coisa, seria só uma questão de boa vontade em ajustar os tons. Minha saudosa avó, que perdeu o esposo com a gripe espanhola (que agora também nem é mais espanhola) dizia que se dois não querem, um não briga.
Ou ao inverso para os dias atuais, quando dois ou mais querem brigar, polemizar, qualquer coisa pode ser pretexto.
E ao povo resta contar com a apreensão e o medo de ser ou não sorteado, ou um parente, um amigo, nesta grande e terrível loteria pandêmica que vivemos.
*JOSÉ ANTONIO LEMOS DOS SANTOS é arquiteto e urbanista; é conselheiro licenciado do CAU/MT, acadêmico da AAU e professor aposentado.
CONTATO: www.facebook.com/joseantonio.lemossantos