O desempenho do Atlético-MG nas últimas edições do Brasileirão evidencia por que o clube está precisando fazer uma verdadeira revolução administrativa na busca de um objetivo que não alcança dsde 1971: a conquista do título do Campeonato Brasileiro. A irregularidade é um padrão nos dados coletados pelo Espião Estatístico de 2014 até 2019, com o time falhando principalmente ao se defender quando atua como visitante.

Nas últimas seis temporadas, o Atlético-MG apostou em técnicos brasileiros de prestígio como Levir Culpi, Marcelo Oliveira, Oswaldo de Oliveira e Roger Machado, mas não conseguiu sustentar campanhas em que conquistasse ao menos 70% dos pontos disputados, desempenho mínimo da imensa maioria dos campeões dos últimos anos.

Últimas campanhas campeãs do Brasileirão

AnoCampeãoAproveitamento
2014Cruzeiro70.2%
2015Corinthians71.1%
2016Palmeiras70.2%
2017Corinthians63.2%
2018Palmeiras70.2%
2019Flamengo78.9%

Em parceria com o economista Bruno Imaizumi, o Espião Estatístico levantou a evolução do Atlético-MG no aproveitamento de pontos nos Brasileirões desde 2014 aplicando modelos estatísticos avançados e considerando sempre o desempenho médio do time nas últimas seis partidas disputadas. A ideia, representada no gráfico abaixo, que evolui por ano e número da rodada, é recordar se ao longo da competição o time vivia fase positiva ou negativa considerando não apenas o resultado da rodada em questão, mas sim um conjunto dos últimos seis jogos disputados. Na rodada #7, por exemplo, consideramos o aproveitamento de pontos nos jogos válidos pelas rodadas #2 à #7 e assim sucessivamente. O Atlético-MG pouco conseguiu manter sequências positivas longas, muito pelo contrário. Em momentos importantes, acabou sofrendo mais gols do que se esperava que levasse e marcou menos.

A evolução do aproveitamento de pontos segue sempre o percentual de pontos conquistados nos últimos seis jogos — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

A evolução do aproveitamento de pontos segue sempre o percentual de pontos conquistados nos últimos seis jogos — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

O técnico português Jorge Jesus afirmou há poucos dias que não aceitou dirigir o Atlético-MG em 2019 porque desejava treinar uma equipe que “jogasse por título”. Ele viu o Atlético-MG vencer o Flamengo por 2 a 1 em casa, mas não se convenceu. Para mudar de patamar em 2020, o Atlético-MG foi buscar o treinador argentino Jorge Sampaoli, que deixou o Santos exatamente por não acreditar que o clube, com severas limitações financeiras, conseguiria superar o Flamengo neste ano. Para montar o elenco, o clube mineiro contratou para diretor de futebol Alexandre Mattos, ex-Palmeiras. O objetivo é investir pesado para deixar a equipe mais consistente.

O torcedor que viveu na pele essas campanhas conhece a história ao longo dos anos. Mas neste momento em que o clube faz uma reestruturação no departamento de futebol, é interessante olhar para trás e ter uma visão geral de por que tantos jogadores e membros da comissão técnica saíram, e novos profissionais, sendo contratados. O que deu errado?

O quadro abaixo mostra como foi a eficiência do time em fazer e evitar finalizações ao longo dos últimos Brasileirões. Cada conclusão feita no jogo tem um potencial estatístico esperado para entrar no gol. É mais fácil fazer um gol de pênalti do que em uma cobrança de falta direta da intermediária, por exemplo. Isso vale para o seu time e para o adversário. A metodologia usada está no final do texto.

O Atlético-MG foi pouco eficiente em seus objetivos, principalmente defensivos, nos últimos Brasileirões. No gráfico abaixo, a cor verde representa o trabalho ofensivo; a cinza, o defensivo. Consideradas as chances criadas, quando o time faz mais gols do que o estatisticamente esperado*, a barra verde fica acima da linha vermelha; quando faz menos gols, cai abaixo dela. Por outro lado, quando o time permite menos gols ao adversário do que o esperado, a barra cinza fica acima da linha vermelha, já que a defesa suportou mais do que se esperava; se o adversário faz mais gols com aquelas conclusões específicas, a barra cinza cai abaixo da linha vermelha, e, normalmente, o técnico cai junto, acaba demitido, como se vê abaixo, sempre considerando o que ocorreu nos últimos seis jogos até a rodada em questão. Vale lembrar que técnicos podem ser demitidos também por eliminações em outras competições, mas há um padrão claro abaixo: o Atlético-MG tem deixado a desejar na forma como se defende.

Eficiência do Atlético-MG em finalizações. A linha preta inclui ataque e defesa e permite ver qual deles a puxa para cima ou para baixo — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

Eficiência do Atlético-MG em finalizações. A linha preta inclui ataque e defesa e permite ver qual deles a puxa para cima ou para baixo — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

Levir Culpi

A melhor colocação do Atlético-MG nessas últimas seis edições do Brasileirão foi o vice-campeonato em 2015. A equipe assumiu a liderança na rodada #11 e a perdeu na rodada #17, no finalzinho do primeiro turno. É quando o verde e o cinza do gráfico acima despencam ao mesmo tempo sob o comando do técnico Levir Culpi.

Em seguida, a equipe manteve a vice-liderança, e Levir Culpi, o emprego. Mas, depois, quando se aproximava a rodada #30, a eficiência defensiva despencou até ficar sem chances de lutar pelo título após a derrota em casa por 3 a 0 para o Corinthians, na rodada #33. Levir acabou demitido depois da rodada #36, empate em 2 a 2 com o Goiás, também em casa.

Com outros treinadores ocorreu o mesmo: ao cair a eficiência em marcar e evitar gols, uma crise tirou o treinador. Os dois próximos gráficos mostram a eficiência do Atlético-MG quando mandante e quando visitante. É evidente como em mais momentos é negativa (abaixo a linha horizontal vermelha) a eficiência defensiva do Atlético-MG e como a linha preta (a eficiência geral) a acompanha mesmo quando o ataque melhora sua eficiência. Ano passado, sob o comando de Jorge Sampaoli, o Santos teve um desempenho defensivo muito bom, mas falhou em momentos-chave da competição.

Eficiência do Atlético-MG quando mandante em Brasileirões desde 2014 — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

Eficiência do Atlético-MG quando mandante em Brasileirões desde 2014 — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

Marcelo Oliveira

Com Marcelo Oliveira, em 2016, a postura da diretoria foi diferente, mas só no começo. O treinador assumiu na segunda rodada do Brasileirão 2016, quando o time já tinha uma vitória, mas a partir daí, o desempenho foi decepcionante, e a equipe despencou até chegar à rodada #8 na 18ª colocação, zona de rebaixamento, sem vencer com ele, empatar quatro e perder três jogos. Curiosamente, o início do trabalho de Marcelo Oliveira foi marcado por queda de eficiência defensiva quando jogava em casa, assim como ocorreu no início do Brasileirão de 2015 com Levir Culpi. A defesa ficou exposta.

A partir daí, a equipe começou a se recuperar, o posicionamento melhorou, o rendimento foi subindo gradativamente, o time chegou à vice-liderança e se estabilizou na terceira colocação. Enquanto foi possível sonhar, tudo ficou bem. Cinco pontos separavam o Atlético-MG do líder Palmeiras na rodada #28. Olhando o gráfico acima fica difícil de entender por que Marcelo Oliveira foi demitido.

Mas é só olhar o gráfico aqui debaixo para entender: fora de casa as coisas começaram a dar errado, com queda da eficiência defensiva. O Atlético-MG empatou com o Corinthians, perdeu para o Botafogo e depois de algumas rodadas perdeu para o Coritiba. O Palmeiras abriu vantagem. Após um empate do Atlético-MG com o Santa Cruz em 3 a 3, Marcelo Oliveira foi demitido após a rodada #36. O quadro abaixo mostra apenas a eficiência nos jogos disputados como visitante. O predomínio do cinza abaixo da linha vermelha simboliza por que no ano passado o argentino Sampaoli afirmou que “no Brasil o mando de campo é muito forte“.

O predomínio do cinza abaixo da linha vermelha evidencia onde o trabalho de Sampaoli precisará ser mais intenso — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

O predomínio do cinza abaixo da linha vermelha evidencia onde o trabalho de Sampaoli precisará ser mais intenso — Foto: Espião Estatístico/Bruno Imaizumi

Roger Machado

Em 2017, o Atlético-MG começou o Brasileirão com Roger Machado, que comandava a equipe desde janeiro e conseguiu um empate fora de casa contra o Flamengo. O ataque começou mais eficiente do que a defesa, mas logo a equipe perdeu poder ofensivo, e na rodada #7, o time estava na zona do rebaixamento, na 17ª colocação. Melhorou um pouco, chegou a oitavo, mas perdeu força novamente, foi derrotado em casa pelo Santos, e foi demitido após a 15ª rodada, depois de perder para o Bahia como visitante. Roger conseguiu o que a maioria dos treinadores não conseguiu no Atlético-MG: deu consistência defensiva à equipe quando atuava fora de casa, mas não o suficiente. Quatro derrotas em oito jogos como mandante incomodaram a direção. Perder para o Bahia em casa foi a gota d´água. Mudar o comportamento de um time é custoso para um treinador, já que o torcedor gosta de times mais ofensivos, ainda que expostos. O trabalho de Roger Machado foi contestado desde o início, mesmo com a conquista do título mineiro daquele ano sobre o Cruzeiro. Para piorar, no início do Brasileirão, mais uma vez a equipe frequentou a zona do rebaixamento. Em sua passagem, desde o início do ano o time levou em média menos de um gol por jogo, mas no Brasileirão foram 17 gols sofridos em 15 jogos.

Rogério Micale

Depois de Roger Machado, Rogério Micale fez o possível para manter equipe competitiva. A treinou da rodada #17 até a #25. Venceu o Coritiba fora, perdeu em casa para o Corinthians. Nem a vitória sobre o Flamengo em casa o salvou, porque o time era muito irregular, alternando vitórias e derrotas. Cinquenta por cento de aproveitamento geral já é pouca coisa, mas ainda houve empates. Demitido.

Oswaldo de Oliveira

Conseguiu retomar a eficiência do Atlético-MG, como fica evidente no gráfico, mas por incrível que pareça, foi surpreendido em casa. A eficiência como mandante deixou a desejar. Assumiu o time na rodada #26 com vitória fora de casa contra o Athletico-PR, derrotou o São Paulo em casa, segurou um empate com o Sport no Recife, mas antes de ganhar do Cruzeiro como visitante, perdeu em casa para a Chapecoense. Depois ainda ficou no empate quando recebeu o Botafogo…

Thiago Larghi

Quando o Brasileirão de 2018 começou, o técnico era Thiago Larghi, que permaneceu à frente da equipe até a rodada #29, se segurando com vitórias em casa, como a obtida na rodada #6, sobre o Cruzeiro, e sofrimento quando visitante. Em casa venceu 10 de 15 jogos; fora, ganhou 3 de 14. Funcionou até que empatou em casa com o América-MG e acabou demitido. Os gráficos mostram como era baixa a eficiência defensiva, o que se seguiu com seu sucessor, Levir Culpi.

Rodrigo Santana

Foi quem iniciou o Brasileirão de 2019 e ficou no comando até a 25ª rodada. O primeiro gráfico, lá no alto da matéria, mostra como foi assustador o final do primeiro turno e início do segundo, quando a equipe chegou a acumular 0% de aproveitamento em seis jogos seguidos. O gráfico de eficiência reflete a ineficiência primeiro no ataque, e depois na defesa. Acabou demitido após uma derrota em casa por 1 x 4 para o Grêmio.

Um grande desafio para Jorge Sampaoli será organizar o sistema defensivo do Atlético-MG de modo consistente tanto nos jogos em casa quanto fora sem que o ataque perca eficiência. Apesar de alguns tropeços muito significativos, no Santos ele conseguiu fazer isso. Seus treinos intensos são fundamentais para manter a equipe mobilizada jogo após jogo, independente do mando. O argentino vai precisar de jogadores muito tenazes para conseguir o objetivo do clube. Por ora, a bola está com Alexandre Mattos. Será interessante ver seu comportamento após o Flamengo ter aplicado uma lógica na montagem do elenco que desbancou o Palmeiras do “melhor elenco do Brasil”.

*Metodologia

Os gráficos de eficiência ofensiva e defensiva levam em consideração cada uma das 55.334 finalizações feitas no Brasileirão desde 2014 e cadastradas pelo Espião Estatístico. Vários fatores são considerados, como distância e ângulo de cada finalização feita e sofrida, momento emocional dos jogadores pela diferença de gols no placar e também pela minutagem do jogo, se atuava como mandante ou visitante e até mesmo as características de cada jogada (se contra-ataque, se jogada aérea, se rasteira), tudo isso foi levado em consideração para que fossem analisadas as eficiências ofensiva e defensiva da equipe e mostradas nos gráficos acima ao aplicarmos modelos estatísticos avançados desenvolvidos pelo economista Bruno Imaizumi especialmente para nossa base de dados.

Cada finalização, dependendo de onde e quando é feita, gera uma pontuação que é relativa à média de todos os jogadores que fizeram finalizações nos Brasileirões. Esse desempenho médio é um referencial para todos os atletas. Os jogadores acima da média marcam mais pontos para a eficiência de suas equipes, e os abaixo da média, puxam esse desempenho para baixo da linha vermelha dos gráficos.

Quando o time é eficiente em fazer e evitar gols considerada a média do que ocorreu no passado, sua pontuação em eficiência sobe acima da linha horizontal vermelha dos gráficos; se o time não é eficiente, desperdiçando chances que outros times conseguiram colocar dentro do gol, sua pontuação ofensiva cai abaixo da linha vermelha. O mesmo vale para os sistemas defensivos. Essas variações nos ajudam a fazer previsões como as utilizadas no Favoritismos.

A equipe do Espião Estatístico é formada por: Caio Carvalho, Guilherme Maniaudet, Guilherme Marçal, Leandro Silva, Roberto Maleson e Valmir Storti. (Globo Esporte)