No dia 8 de março comemora-se o Dia Internacional da Mulher. Nesta época, muito é falado sobre as vitórias femininas e, também, sobre tudo que ainda há para ser conquistado por nós, mulheres. Mas, para as quase 27 milhões de mulheres brasileiras que vivem na chamada linha da pobreza talvez não haja nada a ser comemorado.
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Para essas mulheres falta quase tudo ou tudo. Não é exagero, são mulheres que não têm acesso a atendimento de saúde adequado, programas de prevenção à gravidez precoce, qualificação para o mercado de trabalho, creche para os filhos, alimentação de qualidade, envelhecimento com dignidade.
Tudo começa pela condição de viver na linha da pobreza, o que significa terem que manter a si mesmas – e na maioria dos casos os filhos também – com um rendimento de até R$ 420 por mês, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com uma renda assim, a mulher não consegue nem mesmo ter acesso a um curso profissionalizante, que poderia ser a porta de entrada para empregos melhores, com renda mais digna. Muitas vezes, ela não tem condições nem mesmo de pagar o transporte até um posto que ofereça qualificação profissional.
Essas quase 30 milhões de mulheres também enfrentam a rotina do preconceito de raça, já que a imensa maioria é parda ou preta.
As meninas nessa condição enfrentam o drama da gravidez na adolescência. No Brasil, houve 435 mil nascimentos de mães de 15 a 19 anos em 2018, segundo o Ministério da Saúde. Em 2016, a taxa de natalidade de gravidez na adolescência no país foi de 68,4 para cada mil adolescentes, a maioria pobre e negra, segundo a Organização Mundial da Saúde. A taxa mundial é de 44 para cada mil adolescentes, bem mais baixa que a brasileira.
Já o acesso a creches, necessário para que a mulher/mãe possa trabalhar tranquilamente, é restrito a apenas 35% das crianças brasileiras. O país tem um déficit de 2,5 milhões de vagas em creches, de acordo com próprio Plano Nacional de Educação (PNE). E creche não representa somente um local para deixar os filhos enquanto a mãe trabalha, mas uma forma de dar a eles os estímulos cognitivos necessários na primeira infância.
Segundo o vencedor do Nobel de Economia de 2000, James Heckman, a falta de acesso a estímulos na primeira infância é uma das maiores razões da perpetuação da pobreza e um dos maiores propulsores da desigualdade social. Isto porque, o ser humano desenvolve 90% de nossas conexões cerebrais desde o nascimento até os 6 anos de idade.
O que significa que uma criança que não tem acesso a estímulos nessa faixa etária pode ter sua capacidade cognitiva comprometida pelo resto da vida. Isto significa que a pobreza, a desigualdade e a falta de acesso se retroalimentam e se perpetuam.
E o que acontece com os filhos e filhas das mulheres brasileiras vítimas de feminicídio? Você sabe, porque eu, não. O feminicídio só cresce no país. Em 2019, 1.310 mulheres foram assassinadas no Brasil por seus companheiros ou ex-companheiros. Enquanto outros índices de violência têm diminuído, o feminicídio aumentou 7,2% entre 2018 e 2019, mostrando que não há programas de prevenção a essa violência e os sistemas de proteção são falhos. Consequência da violência são centenas de filhos – boa parte deles adolescentes e crianças – órfãos de mães, muitos com os pais sendo os assassinos, sem proteção, sem amparo, sem políticas públicas que deem auxílio psicológico, físico, educacional e financeiro.
E nem falamos das milhares de meninas que são vítimas de abuso ou exploração sexual. Poderíamos ficar horas falando dos problemas que as mulheres enfrentam no Brasil, por exemplo, acesso a diagnósticos e tratamento do câncer, entre outros. A lista é imensa. Todos os números e estatísticas são para mostrar que o Brasil não tem políticas públicas voltadas especificamente para as mulheres, especialmente às de baixa renda. Políticas que garantam proteção física, capacitação, formação familiar desejada, educação para os filhos.
Políticas públicas que tenham como foco as mulheres desde o nascimento, com garantias de acesso à educação de qualidade – porta de saída da pobreza e da desigualdade; programas de prevenção à gravidez precoce; políticas de prevenção à violência doméstica, neste caso, não somente para as mulheres, mas para os homens também. Melhoria do ambiente econômico para que mais e mais mulheres tenham oportunidade de melhores empregos e renda. Somente assim, vamos evitar que o círculo vicioso de meninas com péssima educação formal, engravidando ainda muito jovens ou sendo vítimas de exploração sexual, fiquem a mercê de homens violentos, pobreza extrema e passem para suas filhas a sina que vivem ou viveram.
*MARGARETH BUZETTI é presidente da AEDIC e da Associação Brasileira do Segmento de Reformas de Pneus.
CONTATO: www.facebook.com/margarethbuzetti/