Aristóteles da Macedônia, discípulo de Platão (Século IV A.C.), considerava que todas as manifestações do conhecimento humano nascem do mesmo tronco, dando substancial importância à aproximação entre caráter e costume, registrando que a virtude do caráter, que é virtude da ética, não se adquire por meio de lições, mas pela prática e repetição, ou seja, pelo costume.

Ainda segundo Aristóteles, o ser humano tem duas características que o fazem diferente dos outros animais: uma é a noção do bem e do mal, do justo e do injusto; outra é a natureza associativa, resultando na sua caracterização como animal político.

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Ética implica, portanto, em uma seleção de comportamentos informados por valores ligados à busca do bom e do justo. Tal seleção não se faz arbitrariamente ou por um processo meramente intelectual, mas ocorre a partir da reiteração da prática.

Por isso, a transmissão de ensinamentos sobre ética pode não ter qualquer significado prático, sendo irrelevante falar de ética, escrever sobre ética, simular respeito à ética, se não houver comportamento ético.

As noções de Ética e o respeito a princípios que culminam com a evolução da humanidade, só podem ser repassados por meio do conhecimento tácito, onde os exemplos sejam esboçados na busca do ideal de felicidade humana, direito reservado a todos, indistintamente.

Com o tempo, aprendi que, independentemente de nossas manifestações de cunho científico, cultural ou religioso, a vida é simplesmente um sistema, porquanto não existe nenhum organismo individual que viva em isolamento.

Os animais dependem da fotossíntese das plantas para ver atendidas as suas necessidades energéticas. As plantas, por sua vez, dependem do dióxido de carbono produzido pelos animais e do nitrogênio fixado pelas bactérias em suas raízes e, juntos, vegetais, animais e microrganismos regulam a biosfera e mantêm as condições propícias à preservação da vida.

Nesse contexto, a definição de papéis sociais é, sem dúvida, o maior desafio do ser humano. Como, afinal, conectar esse sistema universal com as nossas ações diárias, com o nosso mundo particular, sobretudo na perspectiva de que somos agentes revestidos de poder para empreender a tarefa de transformação da sociedade.

John Kenneth Galbraith afirmou que “o exercício do poder é inevitável na sociedade moderna e nada em absoluto se realiza sem isso…. O poder pode ser maligno, do ponto de vista social, mas, do mesmo ponto de vista também é essencial”. Essa essencialidade reside no fato de que o poder é o meio de resolução dos conflitos gerados nas organizações sociais.

O Poder tem sido tergiversado por aqueles que se habilitam a exercê-lo, além da dimensão pessoal. Confundem-no como se fosse uma extensão dos seus domínios – materiais e intelectuais, e, por isso, não é raro constatar práticas reducionistas para adoção de medidas supostamente igualitárias como restritas à sua área de discernimento. Exercer o Poder exige sintonia com o todo. Por isso acredito que alguns dirigentes da modernidade são bem mais incompetentes que aqueles que, arbitrariamente construíram as bases da sociedade moderna.

Os arautos da modernidade criam teses e antíteses que acomodam seus interesses, reproduzindo-as, pelos meios disponíveis, democratizados pela tecnologia, como se fossem a única verdade. E mais…. ousam rotular de incompetente aqueles que propagam posições diversas. Mas na prática, no cotidiano, executam ações completamente díspares.

Além de se portar com Ética é indispensável, ao homem, a sintonia com o todo. Isso pode parecer inexequível. Não é, basta entender a sua finitude e empreender ações voltadas para a compreensão do ser humano, além do nível intelectual ou econômico que ostenta. Não se combate a prepotência com as mesmas armas adotadas pelo opressor. A história está cheia de exemplos.

Sócrates, o grande Sócrates da Grécia antiga, filho de exímio artesão, deixou o conforto e a segurança do lar paterno, abandonou o ofício de ourives, de grande reconhecimento no Século V A.C., para dedicar-se à discussão de princípios de liberdade no mercado municipal de Atenas.

Os gregos perderam um ourives, mas legaram ao mundo o grande filósofo, cuja nota mais marcante foi a sua obsessão pela transformação do homem, na incessante busca da perfeição.

Não é preciso ter grandes conhecimentos para concluir que a sociedade foi construída com as bases lançadas por homens que se não conseguiram a projeção de Sócrates, agiram com suporte em ideias libertárias como as dele.

Assim somos nós. Que me perdoem os ímpios, mas não basta acreditar na possibilidade de construção de uma Nação justa como sonhamos, reproduzindo teses a respeito, sem desencadear esforços para isso. É fundamental a conexão com a realidade. E antenar-se com a realidade requer aproximação, capacidade de interpretação e de transformação dos conflitos. As mudanças não se operam pela peroração de um discurso, mas sim, pela construção de toda a peça.

É desse poder especial que falo – da consciência do todo, do universo…, ainda que na reflexão de coisas diminutas, insignificantes. E isso não se resume à ocupação das redes sociais para ofender ou mesmo disseminar interpretações pessoais sobre algo. Aliás, quase ninguém comunica mais nada. Todos se acham no direito de expressar o que pensam sobre tudo – a partir de fatos e dados – não raro mal elaborados, comentam e julgam, sem qualquer pudor.

Não…. muito do que se dissemina por aí atualmente, não pode ser interpretado como legado de ética. É só a expressão de soberba, vaidade e da arrogância intelectual – mesmo de quem não tem.

*EDMILSON DA COSTA PEREIRA é procurador de Justiça e titular da Procuradoria de Justiça Especializada da Cidadania e do Consumidor

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