Noite de segunda-feira e o improvável acontecendo: servidores e vereadores trabalhando – e muito – na Câmara de Cuiabá. A cena incomum, dando nó na cabeça dos guardas-noturnos, tem motivo: repercutir na imprensa uma nota que a Casa de Leis acaba de publicar, dizendo que não será votada nesta terça a cassação do vereador Abílio – um esforço hercúleo para brecar a manifestação convocada por ele na internet, e que tomou proporções assombrosas.

Só o vereador Toninho de Souza, relator do seu processo de cassação na Comissão de Ética, já registrou mais de um boletim de ocorrência por ameaça nos últimos dias – um comportamento que Abílio tem reprovado, reiterada e veementemente, em seus vídeos e nos vários grupos de apoiadores da manifestação que se formaram no WhatsApp. Mas o fato é que os vereadores da base, incluindo o presidente do Legislativo Municipal, perceberam que a chapa esquentou.

Nem com a retaguarda de dezenas de milhões em verbas publicitárias da Prefeitura a Câmara conseguiu segurar o rojão, e contrariando a matemática, Abilio reacendeu em poucos dias a indignação que andava em banho-maria entre os cuiabanos – desde que o Escândalo do Paletó deixou as manchetes dos principais veículos do estado e foi parar, também inexplicavelmente, nas gavetas do Ministério Público. Restou à Casa de Leis hastear a bandeira branca, às pressas.

Abilio, por sua vez, não desmobilizou a manifestação e garantiu nas suas redes sociais que ela vai, sim, acontecer. Vacinado dos habituais malabarismos regimentais, ele previu que o prazo apontado na nota da Câmara poderia ser facilmente afastado pelo voto da mesma maioria do prefeito que votaria pela sua cassação, e se antecipou. Venceu, portanto, a primeira batalha antes mesmo de acontecer: podem cassá-lo, mas não na surdina – e terão que arcar com isso.

O incêndio causado na internet pelo processo de cassação de Abílio não só assustou os colegas de parlamento, mas fez também figuras políticas locais se posicionarem publicamente contra arrancarem-lhe o mandato: os deputados estaduais Elizeu Nascimento, Ulysses Moraes e Xuxu Dalmolin, os vereadores Felipe Wellaton, Marcelo Bussiki, Diego Guimarães, Dilemário Alencar e Marcelo Bussiki, e até Selma Arruda, entraram de sola na briga. E mais nomes devem surgir.

Se na Câmara o clima é de tensão, no Alencastro o clima deve estar completamente nublado. Divididos entre a lambança de lançar uma obra em terreno alheio e a preocupação com o ato desta terça, a essa altura o staff do prefeito já deve estar consciente do monstro que criaram: às vésperas de uma eleição atípica para o senado, deram início na campanha mais aquecida do MT para a cadeira – e, aos 36 anos, Abilio já provou na Câmara que faria sucesso no Congresso.

Mais do que a manifestação desta terça, em frente à sede do Legislativo cuiabano, os próximos capítulos dessa novela é que prometem: após mostrar que é igual massa de pão, Abilio deverá enfrentar não só o lobby do prefeito – que inegavelmente quer a sua cabeça -, mas também de todos os demais pretendentes ao cargo. Afinal, o que seus algozes querem não é só cassar seu mandato, mas principalmente deixá-lo inelegível e fora das disputas para a Prefeitura e Senado.

*FELLIPE CORRÊA é jornalista e assessor da Câmara de Cuiabá. É  também um dos coordenadores do Programa Pré-Eleitoral Protagonize.

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