Há alguns anos eu li o Ensaio sobre a Cegueira, aclamado livro do escritor português José Saramago, e confesso que foi uma das leituras mais difíceis que já fiz. A obra, que narra a história de uma epidemia de cegueira branca que se espalha por uma cidade, causando um grande colapso social, mexeu comigo.
O próprio Saramago relatou que era um livro francamente terrível com o qual ele desejava que o leitor sofresse tanto quanto ele havia sofrido ao escrever. São mais de 300 páginas de constante aflição, isto apenas levando um dos nossos principais sentidos, a visão. O livro apresenta uma infinidade de lições, mas a que eu queria trazer era sobre a dificuldade de entender a dor do próximo.
A falta de empatia é o grande mal da nossa sociedade atual e se dá por vários motivos. Um deles é que não paramos para ouvir e entender a necessidade dos nossos amigos, irmãos, colegas e assim por diante.
Foi em um contexto de provocação parecido com esse que lá por meados de 2012 surgiu a ‘rashtag’ #PraCegoVer. A princípio parece uma brincadeira de mau gosto ou apenas um trocadilho maldoso, mas na realidade é uma ferramenta usada para educação e inclusão.
Muitos não sabem, mas com o auxílio de programas de leitores de tela, os cegos conseguem ter acesso, em áudio, ao conteúdo em formato de texto. Contudo, permanecem no escuro a respeito de fotos e imagens que precisam ser descritas para que o usuário consiga identificar.
A tag, utilizada em posts e publicações da web, visa realizar uma descrição completa das imagens, vídeos e gráficos a fim de dar acesso ao público cego ou com baixa visão a uma série de informações que, na maioria das vezes, apenas ignoramos.
Eu digo que a tag é uma provocação, porque ao lermos a primeira descrição percebemos o quanto excluímos diariamente mais de 6,5 milhões de pessoas no nosso país (entre cegos e pessoas com baixa visão). Existe uma infinidade de informações que são omitidas de um público e sequer nos damos conta disso.
Quem são as pessoas da foto, o que elas vestem, o que estão fazendo, qual a expressão facial delas. São informações simples, mas que criam a possibilidade que o cego possa ver no sentido de ter acesso, não somente ao conteúdo, mas aos sentimentos envolvidos. Ou seja, ele consegue ver, mesmo que seja de maneira abstrata.
E isso tudo pode ser feito de maneira gratuita e solidária. Para se ter uma ideia, ainda nos dias de hoje, menos de 1% das obras publicadas no mundo é convertida em formatos acessíveis para os cegos.
O #PraCegoVer fala diretamente para toda a população que finge que não vê esse problema. A cidade, o país e o mundo que estamos construindo é para todos e, por isso, precisamos trabalhar para que cada um possa desfrutar totalmente das belezas desse mundo.
Por isso eu faço um pedido: faça a sua parte! Nas minhas redes sociais eu já tenho me empenhado em deixar todo o conteúdo mais acessível, mas nós, como usuários, também podemos ampliar essa rede de conhecimento e levar mais informação para todos.
*DIEGO ARRUDA VAZ GUIMARÃES é advogado, mestre em Direito pela UFMT e Vereador em Cuiabá pelo partido Progressistas
CONTATO: www.facebook.com/diegoguimaraesmt/