Futebol, festas, orgias com mulheres, homens, bebidas, de repente um filho indesejado e uma ex-amante incomodam Bruno Fernandes de Souza, na época – em 2010 – com 26 anos, e no auge da carreira como goleiro do Flamengo. Para resolver a situação com a mulher, ele orquestrou um plano macabro: matá-la, esquartejá-la e dar os restos aos cães.
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A perversidade do caso contrasta com o discurso de ressocialização no sistema penal, pois ao analisar a conduta do ex-jogador, há traços claros de psicopatia, como ausência de remorso, vergonha e empatia. Ele inclusive fez teatro para as autoridades e a mídia, contradizendo-se em vários momentos, atrapalhou as investigações e até brincou com a memória da vítima que não lhe dava sossego, coitado!
Para você que tem dúvidas ou mesmo defende a “segunda chance” para criminosos como ele, conheça e analise melhor os fatos:
30 de julho de 2010: ao apresentar a conclusão do inquérito, o delegado afirma que Bruno, o “autor intelectual” do crime, planejou usar o período da Copa do Mundo entre o início de junho e de julho, na África do Sul, para sequestrar e matar Eliza. “Já estava tudo previamente planejado desde maio”, afirmou o delegado.
26 de outubro de 2010: Bruno afirma que Eliza Samudio não foi assassinada. “Ela está viva em São Paulo. Ela está acabando com a minha vida e eu estou sofrendo muito por isso” (…) Luiz Henrique Romão, o Macarrão, um dos amigos envolvidos na morte reforçou: “Ela falava muito que queria acabar com a vida do Bruno e acabou com a vida de todo mundo. Ninguém matou a Eliza”.
12 de março de 2012: em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o advogado do goleiro, Rui Caldas Pimenta, afirmou que seu cliente falaria à Justiça que Eliza estava, de fato, morta e que seu amigo Macarrão seria o mandante do crime e que teria agido à revelia de Bruno.
24 de fevereiro de 2013: Jorge Luiz Rosa, 19 anos, primo de Bruno, afirma que Macarrão pretendia matar também o filho da modelo com o jogador. “Por ele a criança tinha morrido. Dentro do carro, pegou e falou para mim que só não deixou, porque o cara que executou a mãe não quis fazer nada com a criança. Falou que, com a criança, não”.
19 de julho de 2019: preso há nove anos, Bruno conseguiu “progredir” para o regime semiaberto domiciliar. Ele foi condenado a 20 anos de prisão, em 2013, por homicídio triplamente qualificado, sequestro e ocultação de cadáver. Mas obteve a benesse de cumprir pena domiciliar pelo mesmo Judiciário que, em 2015, no Estado de São Paulo, condenou uma mãe de três crianças a 03 anos, 02 meses e 03 dias de regime fechado por roubar ovos de Páscoa! (rio ou choro, hipócritas?)
Nesse cenário de filme de terror, eis que surge o inexpressivo Operário Várzea-grandense, que resolveu há algumas semanas negociar o passe do goleiro assassino. Fundado em 1º de maio de 1949, o clube possui (segundo a página oficial) 14 títulos do Campeonato Mato-grossense e 01 título da Copa Governador de Mato Grosso. Apesar dos 71 anos de história, o clube quase jogou a toalha em 2016 e fechou as portas:
“Nada funciona, pois nem promoções do clube, com o objetivo de arrecadar dinheiro, o torcedor prestigia”, desabafou o diretor na época. Frente aos desafios de manutenção financeira da equipe, o time tradicional de Mato Grosso optou em fazer o que outros clubes também tentaram para atrair os holofotes. Deixaram de lado qualquer pudor, para se utilizar da máxima: falem mal, mas falem de mim.
Em entrevista recente, o clube alegou que não teme repercussão negativa, afinal, quer lucrar com a repercussão descabida na mídia. “Não perdemos patrocinadores e estamos acompanhando as redes sociais. Digo que a torcida está meio a meio, um pouco mais a favor. Se fosse 80% negativo, a gente já teria repensado. A gente acredita no atleta, e a Justiça não vai impedi-lo de trabalhar”.
Convenhamos, a decisão dos empresários de Mato Grosso demonstra frieza e cinismo ao banalizar o feminicídio em um ambiente amplamente comandado por homens, reforçando assim a violência contra mulheres. Afinal, qual a mensagem passada por um time de futebol que oferece tratamento diferenciado a um criminoso levando em conta somente o aspecto econômico?
Senhoras e senhores, me poupem da falsa preocupação com a recuperação desse homem assassino. Dar uma segunda chance a “Brunão” – como dizem muitos comentários masculinos enaltecendo a figura do ex-jogador logo abaixo da nota de esclarecimento postada pelo time no Facebook (acesse aqui) – por si só é uma afronta à memória de milhões de mulheres em um país onde, a cada 7 segundos, uma de nós sofre violência; e cada 2 horas, uma mulher é assassinada.
Não desejo mal ao goleiro Bruno, que, ironicamente, é o nome do pai dos meus dois filhos e com quem fui casada por 12 anos, um bom homem. É importante destacar que também sou o tipo de pessoa humanista e espiritualizada, que acredita na mudança do ser humano, mas, mais uma vez eu apelo para o raciocínio lógico: quantas promessas de ano novo você já conseguiu cumprir? Mudar é complexo e difícil, mudar é para poucos.
Por outro lado, penso que utilizar a Lei de Talião “olho por olho e dente por dente” não condiz com as exigências do mundo atual. Como diria Mahatma Gandhi, deste modo ficaríamos todos cegos! Aquele que errou precisa ter meios de pagar pelos atos, buscar regenerar-se ou ao menos não se envolver em novos crimes, porém o grande desafio é justamente não transformar “reinserção” em um estímulo para a perpetuação da subjugação de mulheres e minorias (gays, idosos, negros, índios e mendigos).
Quando oferecemos ao ex-atleta palco para se destacar na mídia e nas redes sociais como se nada tivesse acontecido, estamos dizendo o quê? É isso que almejamos para nossas crianças e jovens, um ídolo como Bruno a ser seguido? Quantas Elizas ainda terão que morrer para aprendermos a lição? Diante de tamanha desfaçatez, manifesto publicamente meu repúdio ao Operário Várzea-grandense: goleiro Bruno não! Não suje a camisa de sangue! #meuidolonaoefeminicida
*ROSE DOMINGUES REIS é jornalista graduada pela UFMT, especialista em Liderança e Coaching – MBA pela Unic, com formação em Psicologia Positiva pelo Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento (IPPC) de São Paulo e escreve exclusivamente neste espaço aos domingos.
E-MAIL: rosidomingues@gmail.com