Um denso e sombrio espectro paira sobre o bolso de todos os consumidores-contribuintes brasileiros e mato-grossenses. Trata-se da proposta apresentada pelo Senador Marcelo Castro (MDB-PI) de incluir na proposta de reforma tributária em análise pelo Congresso Nacional a cobrança de royalties sobre energia solar e eólica. O senador propõem um subterfúgio tributário relativamente simples: incluir na Constituição, como “bens da União”, os “potenciais de energia eólica e solar” e permitir a possibilidade de cobrança de participação ou compensação financeira na exploração desses recursos por parte da União, estados e municípios. A maior motivação, segundo o senador, é socorrer os estados e municípios nordestinos que estão quase todos quebrados e precisam reforçar seus caixas.
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Apesar de ser uma ideia completamente estapafúrdia e apresentada em momento inoportuno (tributar o sol e o vento), lembra o senador que a proposta conta com o apoio dos governadores nordestinos e secretários fazendários pois pretende compensar os estados “produtores” desse tipo de energia.
Como forma de solução econômica para conflitos de propriedade, a Constituição brasileira definiu que a posse de petróleo, gás natural, minérios e da água utilizada para geração de energia é da União. Nesses casos, o pagamento de royalties, seria uma compensação pela cessão desse direito de propriedade a terceiros.
Por serem recursos finitos, petróleo, gás e minérios, ao final da exploração inviabilizam a economia das regiões atingidas. Para hidrelétricas, quase sempre há impactos irreversíveis nas áreas alagadas e que inviabilizam outras atividades – nesse caso, a cobrança se dá sobre a geração de energia, e não sobre a água. Em todos os casos, o royalty funciona como uma compensação às localidades atingidas.
Especialistas entendem que não é possível comparar essas situações com a geração de energia solar e eólica. Vento e sol são recursos infinitos e sua exploração não inviabiliza outras atividades econômicas. Ademais, não há conflito de propriedade, pois outras pessoas podem utilizar, ao mesmo tempo, os recursos para outras finalidades, como aquecer água para chuveiros e mover moinhos de trigo.
Ao taxar a energia limpa, o Brasil, pode ficar na contramão do restante do mundo que incentiva a produção de energia limpa e renovável. Recurso renovável, disponível e de uso democrático, o sol é também um recurso imprescindível para agricultura e traz competitividade para a produção agropecuária. Nem por isso vamos taxar o agronegócio que utiliza-se de forma abundante desse recurso.
Para piorar ainda mais a vida dos consumidores, a Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, que regula a produção e distribuição de energia elétrica no país, aprovou nesta terça-feira, 15, o início da segunda fase de revisão da portaria que regula a geração distribuída de energia, com a abertura de uma consulta pública, que prevê redução dos subsídios para o consumidor que implanta painéis fotovoltaicos em sua residência, fazenda ou empresa para gerar sua própria energia.
Criada em 2012 para incentivar a instalação dos painéis fotovoltáicos, a norma atual confere redução de 80% a 90% nas contas de luz desses usuários. Para isso, basta ter espaço e dinheiro – um sistema residencial custa de R$ 15 mil a R$ 25 mil.
Com o incentivo dado pelo governo federal para a aquisição dos equipamentos e consumo, houve verdadeira corrida dos consumidores para instalarem os equipamentos para a microgeração de sua própria energia, nas fazendas, residências urbanas e empresas. Segundo a Aneel, atualmente existem em todo o Brasil 119 mil sistemas e 1,449 MW de potência instalada – o suficiente para atender 4 milhões de habitantes, mais que toda a população de Mato Grosso. A simples circulação da notícia de possível tributação e revisão de incentivos deu uma freada brusca em muitos investimentos já encaminhados e gerou insegurança nos usuários que pretendiam instalar seus próprios equipamentos.
As duas proposições – taxação da energia solar e eólica e a retirada dos subsídios aos consumidores-geradores – têm em comum a insensatez. Trilham caminho diferente do que o mundo está a exigir de todos: produzir e consumir cada vez mais energia limpa e renovável. Espera-se que o debate e a legítima pressão democrática da sociedade possam devolver um pouco de luz e sensatez à Aneel e ao Congresso Nacional, fazendo com que ambos desistam dessa insana empreitada.
*VIVALDO LOPES DIAS é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP
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