Por Rafaela Guimarães

Tratar a obesidade sempre foi um dos maiores desafios da medicina moderna. Hoje sabemos que ela não é apenas fruto de maus hábitos, mas uma doença crônica, complexa e multifatorial — com influências genéticas, hormonais, comportamentais e ambientais. Como médica que acompanha pacientes nessa jornada, vejo a chegada do Mounjaro (tirzepatida) ao Brasil como um divisor de águas.

A tirzepatida é uma molécula inovadora, com ação dupla nos receptores de GIP (polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose) e GLP-1 (peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1). Essa combinação inédita promove não apenas maior secreção de insulina e melhora do metabolismo dos lipídios, mas também maior saciedade, retardamento do esvaziamento gástrico e controle mais eficaz do apetite. O resultado? Uma perda de peso mais significativa e sustentada do que aquela observada com os medicamentos anteriores, que atuam apenas no GLP-1.

Os dados clínicos comprovam esse avanço. No estudo SURMOUNT-1, publicado no New England Journal of Medicine em 2022, pacientes com obesidade tratados com tirzepatida alcançaram uma perda média de até 22,5% do peso corporal em 72 semanas. E o estudo SURMOUNT-4 reforçou a importância da continuidade do tratamento: aqueles que mantiveram o uso atingiram até 25,3% de redução total de peso. Esses números colocam o Mounjaro próximo dos resultados da cirurgia bariátrica — porém, por meio de uma abordagem farmacológica.

Além da redução de peso, a tirzepatida também demonstrou melhora expressiva em marcadores metabólicos: glicemia de jejum, perfil lipídico, resistência insulínica e circunferência abdominal. Para pacientes com pré-diabetes ou diabetes tipo 2, os benefícios são ainda mais evidentes, com taxas de remissão do diabetes em diversos subgrupos.

Em relação à segurança, os eventos adversos mais comuns foram gastrointestinais (náuseas, diarreia e vômitos), geralmente leves a moderados e transitórios. O perfil de tolerabilidade foi considerado aceitável, principalmente diante dos ganhos clínicos obtidos.

A chegada do Mounjaro representa uma mudança concreta nas possibilidades terapêuticas para pacientes com obesidade, especialmente aqueles com quadros mais graves, que até então tinham resultados limitados com os medicamentos disponíveis. No entanto, é importante lembrar que, como qualquer tratamento para doenças crônicas, ele deve estar inserido em um plano de cuidado amplo — com reeducação alimentar, atividade física, suporte psicológico e acompanhamento contínuo.

Vejo essa nova fase da medicina com esperança. A ciência começa, finalmente, a tratar a obesidade com a seriedade e o respeito que ela exige — como uma doença real, que merece terapias eficazes, menos julgamento e mais empatia. A tirzepatida é mais do que uma nova medicação: é um símbolo de progresso no combate à obesidade.

Dra. Rafaela Guimarães é endocrinologista, metabologista e especialista em tratamento da obesidade

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