Nada definido quanto à inconstitucionalidade ou não da Lei 12.197/23, conhecida como Transporte Zero. Na audiência desta quinta-feira (25), no Supremo Tribunal Federal, representantes do Governo Federal apresentaram seus argumentos pela derrubada da lei, mas o governo de Mato Grosso, autor da legislação, também pôde defendê-la.
Ao final de cerca de duas horas de debates, o juiz federal Fernando Ximenes, que representou o ministro André Mendonça na audiência, criou um grupo formado por representantes de cada uma das áreas envolvidas para que apresentem, em sete dias, argumentos jurídicos buscando a flexibilidade da legislação ou provando sua inconstitucionalidade.
“Queremos examinar se há alguma possibilidade de a gente estabelecer algumas condicionantes, alguma espécie de modulação temporal. Um caminho que preserve o meio ambiente e os interesses dos pescadores”, disse o juiz.
De um lado, a Advocacia Geral da União, Procuradoria Geral da República, Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Pesca e da Aquicultura, INSS, MDB, PSD e o deputado estadual Wilson Santos (PSD) que defendem que a lei estadual fere a Constituição Brasileira, a Lei Nacional da Pesca e tratados da OIT.
“Na minha opinião dificilmente haverá um acordo dentro dos princípios constitucionais, por quê? Esta lei quebra os direitos previdenciários dos pescadores, já que os impede de trabalhar em sua atividade profissional por cinco anos. Se não trabalha, como contribui para a previdência? Tira a licença maternidade da pescadora, se não trabalha, não tem direito a benefícios. Outra coisa: a lei nacional deixa claro que a pesca artesanal deve ser mantida e incentivada e esta lei acaba com ela por cinco anos. Portanto, na minha opinião, a lei deve ser derrubada”, disse Wilson.
Já o governador Mauro Mendes que argumenta a necessidade de preservar espécies em extinção, diz que o estoque pesqueiro está baixo e que é preciso criar nova opção de renda para pescadores através de cursos ou do incentivo à pesca artesanal.
“Todo mundo sabe que os peixes em Mato Grosso estão diminuindo. Quando cheguei no estado, ia pescar e tinha muito peixe. Hoje não tem. Outra coisa: está mais que provado que municípios que vivem da pesca, como Barão de Melgaço, não tem como se sustentar. Barão de Melgaço está entre os três municípios mais pobres, com o menor IDH do estado de Mato Grosso. Ora, como que uma cidade que tem 25% da sua população nesta atividade econômica figura entre os três municípios mais pobres de um estado?”, questionou.
“Recentemente a prefeitura da cidade “fechou” porque não tinha dinheiro para pagar a conta de energia de tão miserável, tão paupérrima que é a economia desse município”. “Barão de Melgaço, grave esse nome, é o mais simbólico exemplo de que esta atividade não é capaz de responder pela qualidade de vida, pela sua vivência, principalmente os peixes acabando, como está acontecendo no estado”, enfatizou o governador.
Contudo, Mauro disse que ouviu os argumentos dos órgãos federais e que vai apresentar algumas modificações na lei “que possam eliminar algum vício jurídico existente” e “também contemplar alguns interesses desses pescadores que poderão continuar exercendo a sua profissão”. Entre eles, a proibição de armazenamento, transporte e venda de apenas 13 espécies de peixes: barbado, bicuda, cachara, caparari, dourada, dourado, jaú, matrinxã, pacu, pintado, piraíba, pirara, pirarucu e surubim. Todas as demais, cerca de 100 encontradas nos rios de MT, estariam livres da lei.
O Argumento de Mendes não convenceu o representante do Ministério do Meio Ambiente, Gilberto Salles.
“Querem resolver um problema complexo com uma solução simplificadora. Me parece que essa é a essência desta discussão. A atividade pesqueira requer uma série de instrumentos, de trabalhos e dados. É dinâmica e essa lei me parece que congela o processo. Esse é o ponto principal. O maior desafio que o estado tem agora é apresentar uma alternativa. Espero que a gente avance e Mato Grosso volte a ter gestão pesqueira no estado e não soluções simplificadoras”, disse
Mas cedo, Salles disse acreditar que uma boa saída seria suspender os efeitos desta lei “até que um novo, sério e grande estudo possa ser feito em parceria entre o estado e a União sobre a viabilidade da pesca no estado”. “Só com este estudo em mão é possível se debater novamente a atividade”.
O deputado federal Emanuelzinho, que representou o MDB, também acredita na derrubada da lei.
Os órgãos do Governo Federal presentes a esta audiência entendem esta lei como uma afronta ao direito existencial e à sobrevivência dos pescadores e das comunidades ribeirinhas de Mato Grosso. Não há comprovação de causalidade entre a pesca artesanal e a dita queda no estoque pesqueiro. Estou muito esperançoso que o ministro André Mendonça, a partir do debate de hoje, possa aprofundar sua análise e que muito em breve declare esta lei inconstitucional”.
(Robson Fraga)