Desde eu menino que a/o Feira/ Mercado do Porto é no Bairro do Porto; antes, porém, fora na Generoso Ponce (dessa não tenho lembrança). À época, morávamos na Goiabeira de Baixo (atual Rui Barbosa); como não tínhamos carro, íamos a pé à feira (era feira e não mercado. Não havia cobertura.) que ficava atrás do Dutrinha, em frente ao Arsenal de Guerra (Sesc Arsenal). Ir não era o problema; voltar sim (nem sempre sobrava para o “carro de praça”). Ainda não existiam as famigeradas sacolas de plástico “descartáveis”; as mercadorias eram embrulhadas em jornais ou em “papel de pão” e, posteriormente, acondicionadas em sacolas de lonita (um tipo de plástico durável) e com argolas alumínio (que, por causa do peso, feriam nossas mãos). Meu pai, eu e meu irmão caminhando por ruas sem asfalto e sonhando com um espetinho de “gato”. Ir à feira era um acontecimento, todos se conheciam: meu pai passava mais tempo conversando com amigos que comprando…

Em 1994, Dante muda a feira para o Campo do Bode, próximo ao Mercado do Peixe (Museu do Rio Hid Alfredo Scaff), aliás, sob protestos de feirantes e de frequentadores (como sempre, a maioria incapaz vislumbrar o amanhã…). Assim, a feira vira mercado e torna-se, aos finais de semana, local de encontro da cuiabania. Cuiabá cresceu e mostrou-se ainda mais “agarrativa”, como apregoa Teocles Maciel, o Mercado do Porto passa a ser um espaço de cuiabanos de ontem e de hoje, de cuiabania e de cuiabanidade (ambos os termos caracterizam noções de ser e de pertencer), como muito bem colocou o Dep. Júlio Campos. Depois de 29 anos, o prefeito Emanuel Pinheiro transforma a Feira do Porto em Mercado do Porto Antônio Moisés Nadaf com a inauguração da primeira etapa de uma obra hercúlea. Cuiabá, até 2024, terá um dos melhores mercados do país. Antes de ser um local de abastecimento de víveres, o Mercado do Porto é um espaço de Cidadania e de Democracia.

De Cidadania porque nos renova a ideia de pertencimento social, econômico e cultural. De Democracia pois ali convivem todos os matizes e viéses políticos. Na inauguração, estavam presentes políticos tanto de situação como de oposição: Emanuelzinho e Stopa; Eduardo Botelho e Wilson Santos – aqui meu único senão: Wilson enquanto ex-prefeito de Cuiabá teria o seu direito de fala garantido, o que não ocorreu. Em que pese a insana “guerra” entre o governador de Mato Grosso e o prefeito de Cuiabá; este, elegantemente, colocou o nome do governador Mauro Mendes na placa de inauguração do nosso Mercado do Porto. Corretíssimo, prefeito: Cuiabá e o povo cuiabano estão acima de picuinhas políticas.

Ao ouvir a Viola de Cocho, o Ganzá e o Mocho ecoarem pelo mercado, possuído por um sentimento atávico, escrevi “Mercado Porto”: Ah! Desde o tempo do Arsenal de Guerra/já eras exemplo de paz,/ De demais e de demás…/ Os homens lá da roça/ traziam a galinha, o porco e a mandioca/ e muitos frutos da terra/ no lombo de bois e em carroças…// Ontem, em tuas ruelas fluidas,/ em teus largos surreais/ brotavam estórias colossais/ que nem o tempo dilui…// Hoje, com tua passarela sinuosa/ contrastando com teus traços retos/ merejam de tuas paredes de concreto/ cores e sabores de comidas gostosas…// Mercado do Porto,/ tens a manga, o caju e o cajá/ tens a pimenta e o mel/ tens o queijo e a rapadura/ tens a grosa e o guaraná/ tens a cachaça e quebra-torto/ E se a vida se mostra dura;/ tens tudo, até um pouco de céu…

*SÉRGIO EDUARDO CINTRA é professor de Linguagens, de Redação em Cuiabá, e servidor do TCE-MT. Foi Diretor Executivo da Funec. 

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