Fernando Diniz foi apresentado nessa quarta-feira como técnico interino da seleção brasileira. Em evento na sede da CBF, no Rio de Janeiro, ele concedeu entrevista coletiva na qual evitou falar de Carlo Ancelotti e rechaçou qualquer conflito de interesses por seguir à frente do Fluminense.

– Ancelotti é questão do presidente, vou falar sobre meu estilo. Vou reproduzir o que me trouxe aqui, o que muda é a fartura de jogadores, a melhor matéria-prima do mundo para tentar executar as ideias que eu tenho – disse Diniz.

Em diferentes momentos, Diniz foi questionado sobre como vai se dividir entre clube e Seleção. Perguntado se havia algum dilema ético por permanecer no Fluminense, ele deu a seguinte resposta.

– Vou ter que fazer uma convocação e tomar as decisões. E a ética que tenho que vai pautar minhas decisões. E as pessoas vão avaliar conforme o juízo de cada um. Eu que tenho que pensar o que devo pensar e deliberar sobre minhas decisões. Estou extremamente tranquilo, e nesse ponto a CBF apontou a pessoa certa – declarou.

– A ética tem a ver com a pessoa que vai tomar as decisões. Se as pessoas presumem que vai ter conflito de interesse, vai dizer que não tenho ética. Se eu tomasse minhas decisões com base naquilo que pensam, não faria nada no futebol. Porque minha carreira é muito mais recheada de críticas do que de elogios por causa da minha maneira de enxergar o mundo – completou.

Com contrato de um ano com a Seleção, Diniz vai dirigir o Brasil até a chegada de Carlo Ancelotti, que tem compromisso com o Real Madrid até o meio de 2024. A CBF dá a contratação do italiano como certa e, na última terça, o presidente da entidade, Ednaldo Rodrigues, disse que o treinador assumirá a partir da Copa América de 2024.

– Meu contrato é de um ano. Penso em fazer o melhor possível. Não decidimos se engloba Copa América. O planejamento de Carlo Ancelotti é da CBF, meu compromisso é fazer o melhor que eu puder fazer – disse.

Diniz fará a estreia pela Seleção em setembro, pelas Eliminatórias, contra Bolívia, em casa, e Peru, fora.

Confira outros trechos da entrevista Fernando Diniz:

Conflito de interesses

– Já falei que construí minha carreira como treinador muito baseado no que fui como jogador, no sentido de sofrimento quando jogava. O que mais me incomodava era a falta de ética no futebol. Pessoas confundirem os jogadores que jogavam bem por serem boas pessoas, muitas vezes não correspondia aos fatos. Muitas vezes, quem estava procurando seu lugar ao Sol era julgado por aquela bola que entra, que não entra, o que dá certo, o que não dá certo. A ética que tenho me fez suportar por muito tempo e ter o desejo de me tornar o treinador que me tornei.

Mais sobre ética

– Se quiser, tenho a tarde toda para falar desse tema. É uma questão prática, mas está recheada de subjetividade. Vai basear muito na minha ética. A gente está antecipando chance de acontecer. Quando estiver na CBF, vou trabalhar pelo melhor da CBF e olhar o futebol brasileiro como tudo e tomar melhor decisão possível. Sempre tem alguém questionando alguma coisa. Pode ter. Mas não vai ser baseado na falta de ética. Vou procurar fazer o melhor de que tenho conhecimento e com a ética, que é o que preservo muito.

Só 12 meses?

– Não sou pessoa de fazer muita projeção. Quero cumprir esse prazo de 12 meses e fazer uma coisa de cada vez. Em relação ao Neymar, minha opinião é que a palavra que me vem é que é quase uma aberração. Supertalento, que demora muito tempo para nascer outro. O Brasil tem a sorte de ter um jogador assim de tempos em tempos. A gente tem que tirar o máximo dele. É um fora de série quando se trata de jogar futebol.

Últimos dias

– Foram dias de alegria e ansiedade. O presidente (da CBF) procurou o Mário (Bittencourt, presidente do Fluminense). Foi um gesto respeitoso em relação ao Fluminense. O Mário me perguntou sobre o interesse da CBF. Eu fiquei muito honrado de ser escolhido.

Cogitou deixar o Fluminense?

– Questão de ser exclusivo da CBF não foi mencionada em nenhum momento. Para falar a verdade, neste momento, jamais sairia do Fluminense para ser só da CBF. Embora fosse um sonho, seria uma coisa que teria que adiar. A gente ponderou muitas coisas, sou muito grato pelo Fluminense, torcida do Fluminense, e acredito que a maioria vai entender. Da maneira que ficou, me sinto muito à vontade para desempenhar o meu trabalho. Acredito que foi um grande acerto.

Pouco tempo para trabalhar na Seleção

– É uma coisa que interfere, de fato tem menos tempo. Mas as coisas básicas, acho que consegue passar com pouco tempo, ter alicerce para aos poucos ter a ideia. O jogo vai ter fluência, vai se encontrando. Com pouco tempo, já dá para colocar alguma coisa do nosso trabalho. A gente não vai fazer mudanças táticas radicais com um, dois dias de treino. Mas alguma coisa a gente consegue melhorar. Meu trabalho não se resume nesse olhar mais comum, saída do goleiro. Futebol é mais que isso. Eu vou partir do pressuposto que o tempo que tiver, vou saber aproveitá-lo bem. E aos poucos os jogadores vão amadurecendo as ideias táticas que tenho na cabeça.

Trabalho duplo

– Vou me dedicar 100% onde estiver. Quando estiver no Fluminense, dedicação total. Vou sair daqui e estudar o Inter. Quando estiver na Seleção, vou me centrar e me dedicar totalmente à Seleção. Claro que sou ser humano e não dá para fazer corte radical. Minha dedicação vai ser máxima onde estiver naquele momento.

Seleção é momento?

– A gente vai saber escolher os jogadores que vamos ter que ter em alguns momentos, como Eliminatórias e amistosos. Não tem nada pré-determinado. Tem alguns jogadores que têm uma idade, de 25, 26, 27 anos que são constantemente convocados. Tem algumas figuras que vão aparecer, como sempre acontece. Mas a gente sempre vai estar aberto para fazer as melhores convocações possíveis.

O que mudar na Seleção?

– Uma das coisas que a gente tem que discutir no Brasil, essa coisa que a gente tem em relação a resultado. A gente determina o valor do time, de pessoas, com uma bola que entra, uma bola que não entra. A gente foi eliminado pela Croácia sendo muito superior à Croácia. A gente perdeu nos pênaltis e acha que foi tudo ruim. No processo, a vida é muito mais que isso. Não significa que não tenha apreço pela vitória. Quem trabalha de uma forma, acreditando no processo, acredita que não está muito ruim quando um goleiro falha, quando uma bola não entra. As coisas vão muito além disso. Quando a gente demoniza a derrota, que é sempre muito ruim. É um desejo muito infantilizado de achar herói e vilão o tempo todo. Quando temos os resultados, como foi o Carioca com o Fluminense, foi resultado de um trabalho muito bem organizado, muito bem executado, e foi um feito histórico. Mas tem trabalho por trás disso. Se não tivesse vencido, eu não ia me achar o pior dos treinadores porque não venceu. Uma das coisas que a gente tem que discutir é a maneira de analisar tudo por causa da bola que entra, que não entra. Para mim, isso não contribui com nada. (GE)