Ele foi o maior estrategista da história política de Várzea Grande, venceu quatro eleições para deputado estadual e foi prefeito do município. Com o amigo seu Fiote, formou uma dupla imbatível nas urnas, vencendo todas as eleições que disputaram, como e quando quiseram. Um mito: é Licínio Monteiro da Silva; tratado por muitos como a Enciclopédia da Política varzeagrandense.
Considerado ainda hoje ainda hoje o melhor articulador político da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, o ministro aposentado do Tribunal de Contas do Estado, Licínio Monteiro da Silva, é a história viva da política de Várzea Grande. “Ele conseguia acordos impossíveis quando era líder da maioria – hoje figura desempenhada pelo líder do governo: só não fazia chover”, recordava o ex-prefeito de Várzea Grande e ex-deputado estadual Gonçalo Botelho de Campos, o Nhonhô Tamarineiro. “O homem tem que ter palavra: se cumprir o que promete, sempre será respeitado por todos, seja aliado ou adversário”, dizia Licínio Monteiro.
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Filho de Crescêncio Monteiro da Silva e dona Margarida dos Santos Botelho, ele nasceu no dia 17 de março de 1903, em Nossa Senhora do Livramento. Teve dez irmãos, entre eles Emiliano Monteiro da Silva, que foi prefeito de Nossa Senhora do Livramento.
Em 1926, se casou com dona Izabel de Almeida e Silva, a dona Bebé, com quem teve três filhos: Sebastião, Sebastiana e Licínio Filho. Com a esposa viveu 58 anos, até que dona Bebé faleceu, aos 76 anos, em 1982. Licínio lembrava com saudades dos tempos em que militava na vida pública. “A gente saía avisando os amigos que era candidato; nem precisava fazer campanha, porque o voto era seguro…não existia essa história de se gastar rios de dinheiro na eleição”, recordava ele.
Monteiro da Silva não gostava de lembrar da morte de dona Bebé e todas as perguntas sobre os 58 anos de convivência que tiveram ele preferia não responder.
VITÓRIA DE RAPOSA
Nos bastidores, Licínio era classificado como “o invencível”. Compadre de Júlio Domingos de Campos – o seu Fiote, padrinho do senador Jaime Campos, Monteiro da Silva sempre teve uma grande ascendência sobre a família Campos.
Com seu Fiote, formou a dupla dinâmica da política varzeagrandense. Venceram todas as eleições que disputaram, quando e como quiseram.
Licínio Monteiro foi o primeiro deputado estadual eleito por Várzea Grande, 1949, numa época em que os líderes políticos do Sul (Hoje Mato Grosso do Sul) dominavam a Assembleia Legislativa. Foi personagem decisivo para a emancipação política-administrativa da Cidade Industrial, 1948. E ainda indicou o primeiro prefeito nomeado de Várzea Grande, major Gonçalo Romão de Figueiredo, que chegou a tenente-coronel da Polícia Militar e viveu seus últimos dias em Rondonópolis.
Romão de Figueiredo governou o Município de 1º de janeiro de 1949 até 25 de julho do mesmo ano. “Compadre essa eleição é sua”, avisou Monteiro da Silva ao fiel amigo Júlio Domingos de Campos, em 1950.
O PSD precisava de um candidato forte a Prefeitura Municipal. Então, em 50, seu Fiote foi eleito prefeito de Várzea Grande e Licínio reeleito deputado estadual.
Já em 53, Licínio decidiu disputar a Prefeitura da Cidade Industrial e venceu. Governou o Município de 1953 até 1957. Então formou nova dobradinha com seu Fiote. “Olha compadre, vou voltar para a Assembleia, o pessoal de Campo Grande tá com a vida mansa por lá”. Ganharam novamente: Fiote prefeito e Licínio deputado estadual, em 1958.
Afirmando estar cansado dos problemas enfrentados com a oposição, no Palácio Filinto Muller (Praça Moreira Cabral), em Cuiabá, Monteiro da Silva havia decidido não se candidatar mais, em 1961. Contudo, pressionado pelos correlegionários, foi candidato a deputado estadual outra vez em 62. Licínio acabou o pleito como o parlamentar mais votado da região Norte de Mato Grosso.
Seguramente teria vencido para a Câmara dos Deputados ou Senado da República, caso de candidatasse, naquele ano. Preferiu continuar deputado estadual para não se distanciar da família, porque naquela época, 1962, Brasília estava conturbada com o governo de João “Jango” Goulart.
Quando tomou posse, em 1963, prometeu para dona Bebé e seus filhos que havia disputado sua última eleição. E cumpriu. Em 1966, teve seu nome aprovado por unanimidade, na Assembleia, para ocupar uma cadeira de ministro (hoje conselheiro) do Tribunal de Contas de Mato Grosso. Em 70, se aposentou, após presidir o TCE.
OBRAS SEM ALARDE
Licínio também sempre foi um lutador por Várzea Grande. Quando era prefeito, por exemplo, abriu a estrada que liga a sede do município aos Distrito de Souza Lima. Depois construiu a estrada que une Souza Lima ao Distrito de Capão do Pequi, um dos mais distante do município. “Para a época, foi uma obra sem precedentes”, recordava seu Fiote, observando que Monteiro da Silva tirou dezenas de famílias do esquecimento.
No governo de Licínio, a prefeitura do município perfurou vários poços, construiu escolas públicas, a Delegacia de Polícia e a Cadeia Pública da cidade. O comércio começou a desenvolver e Monteiro da Silva ofereceu facilidades para a instalação de novas empresas. “Mas ele nunca fez propaganda de suas obras”, dizia Fiote.
ESTRATEGISTA
Existem muitas histórias e estórias sobre a atuação de Licínio na Assembleia, em 16 anos de Poder Legislativo. Certa vez, os deputados da UDN queriam derrubar um veto do então governador João Ponce de Arruda. Monteiro da Silva era líder do governo na Assembleia.
Primeiro, se reuniu com os deputados oposicionistas. Depois, com os parlamentares do PSD e convenceu-os a derrubar o veto do governador. Na época, Ponce de Arruda ficou furioso. Nos anos subsequentes, todos os projetos do Poder Executivo enviados ao Legislativo foram aprovados. A maioria por unanimidade. Até hoje pouca gente sabe o que Licínio acertou com os udenistas.
Outro episódio teria acontecido quando Licínio foi prefeito de Várzea Grande. Dos nove vereadores do município, seis pertenciam à UDN e apenas três ao PSD. Monteiro era bombardeado na maioria das sessões. Um dia compareceu à Câmara dos Vereadores e convidou os parlamentares para a conversa “ao pé do ouvido”. Todos ouviram as suas ponderações. A partir daí, Licínio não teve mais dificuldades com a oposição e ainda arrastou para o PSD três vereadores que eram da UDN. Naquele tempo, mudar de partido era uma traição vergonhosa, quase uma heresia. Pecado Mortal. “Eu apenas pedi para que os vereadores trabalhassem conosco lado-a-lado”, afirmou Licínio, com os olhos brilhando.
Há quem diga que Monteiro da Silva conquistou os parlamentares udenistas ao garantir que pediria votos “de porta-em-porta” para a reeleição de todos, caso se filiassem aos PSD. Os que seguiram Licínio, foram reeleitos.
Nos últimos anos de vida, sempre ficava deitado em sua rede, no seu quarto, Licínio conversava pouco sobre política. Na parede, apenas uma foto dele ao lado de dona Bebé e um escudo do Clube Operário Varzeagrandense, trabalhado em couro, com as inscrições “ao ministro Licínio Monteiro da Silva, sócio benemérito do Clube Operário”.
Mesmo à distância, ele acompanhava a política de Mato Grosso, dando maior atenção para a cidade de Várzea Grande.
Gostava em quando possuía condições físicas de ir à Prefeitura Municipal conversar com o então prefeito Carlos Gomes e com os frequentadores do Paço Couto Magalhães.
Ao final da entrevista (janeiro de 1992), Monteiro da Silva perguntou se o candidato do “meu afilhado Jaime” à prefeitura de Várzea Grande era mesmo o filho de Nhonho Tamarineiro, o deputado Nereu Botelho de Campos. Diante da resposta afirmativa, seu Licínio franziu a testa. Seu único comentário: “Mas Nhonho é da UDN e Fiote é PSD”. Ele demonstrava uma lucidez impressionante, para um homem de 88 anos.
Licínio Monteiro da Silva, faleceu em 1º de maio de 1993, aos 90 anos e deixou um grande legado político para a história do Estado de Mato Grosso.
Wilson Pires de Andrade é jornalista profissional em Mato Grosso.