Estamos a viver num mundo virtual. De mensagens instantâneas, escravizados, talvez, pela necessidade de conhecer. Conhecer com profundidade? Na maior parte das vezes, não. Vivemos na era da superficialidade, onde a mediocridade reina e clama pela objetividade. Textos curtos, sem exageros acadêmicos, bastam para o “internauta”.
As grandes teses jurídicas, as sentenças judiciais que, além de fazer justiça, já nos embebeciam de talento literário e inovação, ficaram no passado. As “obras culturais” são quase sempre reprovadas pela Academia Brasileira de Letras, e por insuficiência. Os jornais vêm perdendo espaço para as mídias de manchetes. O conteúdo não interessa mais.
Leia Também:
– Curupira, Pai do Mato, Caipora, cadê você?
– Liberdade como possibilidade
– Democracia e constitucionalismo
– Fígado saudável, alma que suporta…
– Os Santificados…
-Qualquer pensamento, qualquer existência
-Do pensamento, felicidade!
-Sou por estar
-Amar, de menos a mais
-Ouvir e calar
-Rir e chorar
-Somos e sermos…
-Violência circular
-Dever para com o povo
-A verdade que basta
Mas a novidade disso tudo está na inserção livre dos comentários. Têm de todo tipo: ideológicos, com erros de grafia, maldosos, elogiosos etc. Por eles, nitidamente, percebe-se a estatura moral e intelectual de seus assinantes, aliás, anônimos na maioria.
O povo não está obrigado a entender de tudo – medicina, direito, engenharia, literatura… -, mas a obrigação, aqui, tem outro norte, reside na civilidade. Como Jesus afirmou, a chibatada quebra os ossos, mas a língua fere a alma. Todos estão a julgar a todos, não importa mais o sentimento, o dever de solidariedade.
Antes de seu falecimento, Umberto Eco, dialogando com um público de formandos de comunicação e cultura, afirmou: “A mídia social dá o direito de falar a legiões de idiotas que antes conversavam apenas no bar depois de um copo de vinho, sem prejudicar a comunidade. Eles eram rapidamente silenciados, e agora eles têm o mesmo direito de falar de um Prêmio Nobel. É a invasão dos imbecis”.
A crítica faz parte da obra de quem escreve, aliás, da própria sociedade. Embasada em fundamento racional, somente eleva e aperfeiçoa. Mas, quando permeada por ignorância ou má-fé, o remédio acaba sendo o “cala-te”, mediante ação judicial. Contudo, resolve?
Prefaciando o livro de Mário Rosa, “A Era do Escândalo”, Nizan Guanaes escreve: … “Ninguém está imune a um acidente ou incidente. São estresses da vida moderna, facetas da vida das pessoas… Todos estão expostos ou querem se expor. Nunca houve tanta exposição da vida das pessoas, da sexualidade às opiniões. Qualquer erro, por menor que seja, pode ganhar proporções inimagináveis”.
O mundo está cada vez mais ligado na aparência. O padrão de virtude tende a se perder do que era para o que será. O ser como imagem está aniquilando o ser em essência. Os bons devem reagir e quebrar paradigmas, senão acabarão por se afastar das convenções sociais e da própria sociedade, ou serem afastados, também.
Chegamos a um patamar alto de excelência tecnológica, das ciências exatas e humanas. Porém, carecemos de mais compreensão, amizade e sinceridade. O ódio se instala onde o amor se perde.
O propósito da vida passou a ser tarefa dos que se arriscam, enfrentam as adversidades, protagonizam os acontecimentos e se adiantam na solução dos conflitos. Viver tem sentido de lutar; lutar contra a hipocrisia social e as “verdades” dos idiotas, também contra as “certezas” dos anônimos.
É por aí…
*GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO (Saíto) é formado em Filosofia e Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT); é membro da Academia Mato-Grossense de Magistrados (AMA), da Academia de Direito Constitucional (MT), poeta, professor universitário e juiz de Direito na Comarca de Cuiabá. E é autor da página Bedelho Filosófico (Face, Insta e YouTube).
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