No início de outubro, em 2001, quando chegavam as primeiras chuvas da temporada no Centro-Oeste, morreu no Rio de Janeiro Roberto Campos, abatido por um infarto, aos 84 anos.

Lá se vão mais de vinte anos sem sua inigualável presença: inteligência, combatividade, verve. Era um arraso para as esquerdas, que combatia com argumentos sólidos e com um humor corrosivo e fulminante. Era uma figura conhecida no meio político brasileiro, e por consequência, também em  Mato Grosso, sua terra natal.

Mato-grossense de Nossa Senhora do Livramento,  de família humilde, mas dotado de brilhante inteligência, sempre buscou se ilustrar. Perdeu o pai aos cinco anos. Sem meios de custear o estudo superior, ingressou em um seminário mineiro aos 17 anos, de onde saiu antes de se ordenar padre, para tentar a vida no serviço público. Ao ingressar por concurso no Itamaraty, aos 22 anos, estava abrindo para si as portas de uma carreira que seria notável, e não só como diplomata.

Designado para servir nos Estados Unidos, não se acomodou. Fez uma pós-graduação em Economia, enquanto trabalhava em Washington. Sua inteligência sempre foi chamativa, o que lhe valeu convites para trabalhos importantes no governo (eleito) de Getúlio Vargas, no de Juscelino e no de Castello Branco.

No governo Jango foi embaixador do Brasil nos EUA e, no governo Geisel, embaixador no Reino Unido. Em todos os cargos deixou marcas importantes. Basta dizer que participou da criação da Petrobrás, do Banco Central, do BNDES, do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) e do BNH (o extinto Banco Nacional da Habitação). Foi um dos redatores do Estatuto da Terra, no governo Castello Branco.

Quando era embaixador do Brasil, em Londres, decidiu ser candidato ao Senado por Mato Grosso, seu Estado natal, na chapa encabeçada pelo deputado federal Júlio Campos, que naquele ano se elegeu governador.  Roberto Campos, embora pouco presente,  sempre nas altas esferas ou no exterior, era mato-grossense, e muito conceituado.

Roberto Campos era um mestre nos debates, sempre pronto nas respostas, cortante nos apartes, demolidor nas discussões. As esquerdas o odiavam, e tinham boa cobertura da imprensa, que, com predominância canhota, também nunca o engolia.

Roberto Campos deixou uma alentada autobiografia, “Lanterna na Popa” (Topbooks, 1994), e recebeu uma homenagem em seu centenário, promovida pelo editor José Lorêdo Filho, organizada pelo jurista Ives Gandra da Silva Martins e pelo economista Paulo Rabello de Castro: uma publicação de depoimentos de pessoas que conheceram e conviveram com notável embaixador, economista, congressista e tanta coisa mais.

Três dezenas de testemunhos de sua importância na história brasileira. O livro chamou-se “Lanterna na Proa — Roberto Campos Ano 100” (Resistência Cultural, 2017). Vale a pena sua leitura: retrata por inteiro uma das mais importantes personalidades brasileiras da atualidade.

Algumas de suas frases de espírito 

“O que os governos latino-americanos almejam é um capitalismo sem lucro, um socialismo sem disciplina e investimento sem capital estrangeiro.”

“O PT é o partido dos trabalhadores (que não trabalham), dos estudantes (que não estudam) e dos intelectuais (que não pensam).”

“No socialismo, as intenções são melhores que os resultados; no capitalismo, os resultados são melhores que as intenções.”

“Continuamos a ser colônia, um país não de cidadãos, mas de súditos, passivamente obedientes às autoridades. No fundo, a diferença é que, antes, a autoridade era Lisboa, e hoje é Brasília.”

“Nunca me iludi com o totalitarismo de esquerda, por uma razão bastante simples: Deus fez os homens profundamente desiguais.”

“Nossos artistas e intelectuais de esquerdam admiram o socialismo de Fidel Castro, mas adoram três coisas que só o capitalismo pode oferecer: ausência de censura, cachê em moeda forte e consumismo burguês. São filhos de Marx numa transa adúltera com a Coca-Cola.”

Frases cortantes sobre a detalhista Constituição da República de 1988

“A palavra produtividade só aparece uma vez no texto constitucional; as palavras usuário e eficiência, duas vezes. Em garantias, fala-se 44 vezes, em direitos 76 vezes, e em deveres, apenas 4 vezes.”

“A Constituição afirma que a saúde é um direito de todos. Os idosos, como eu, sabem que é capricho do Criador.”

“É difícil exagerar os malefícios desse misto de regulamentação trabalhista e dicionário de utopias em que se transformou nossa Carta Magna. A Constituição promete-nos uma previdência social sueca com recursos moçambicanos e um país ideal onde é mais fácil o divórcio da mulher do que a dispensa do empregado.”