Segundo Corrêa Filho a ipecacuanha é uma planta americana de conhecimento das tribos indígenas, cujo alcaloide contém a emetina, que após separada, é um agente terapêutico. A presença da poaia facilitou o comércio com os índios da região do Alto rio Doce para o rio Pomba, distante um do outro a 53,7 km, em Minas Gerais, em 1766.
A referência a planta está presente no relato de botânico C. P. F. Von Martius, que ao seguir de “Vila Rica à aldeia dos índios coroados na margem do rio Xipotó”, em abril de 1818, anotou em sua obra “Viagem pelo Brasil”, o seguinte:
“Para o botânico, são estas matas muito importantes, sobretudo pela riqueza em plantas medicinais, embora a constante umidade não favoreça a colheita das plantas. A verdadeira poaia é aqui achada em abundância”.
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A ipecacuanha foi encontrada em abundância na maior parte da Serra do Mar, desde o Rio de Janeiro até o Norte, na Capitania da Bahia, nas matas úmidas, em lugares sombrios e sempre em companhia, cujas raízes eram colhidas pelos índios, e pelos negros escravos dos fazendeiros da vizinhança e, depois levada à exportação, relatou Martius.
A planta além da Serra do Mar aflorou na Bahia, no Pará e, principalmente, em Mato Grosso, espécie inscrita nos anais botânicos de Richard Francis Burton, com o título de Cephaelis ipecacuanha.
Frederico Carlos Hoehne (1882-1959) que examinou o seu habitat, assim descreveu a ipecacuanha: “A verdadeira “Poaia”, ou Poaia preta” ou “Ipecacuanha verdadeira” é a citada Cephaelis ipecacuanha A. RICH., que, primitivamente aparecida nas matas da Serra do Mar, na Bahia, no Mato Grosso e Pará. Em Mato Grosso é encontrada na Serra dos Parecis, vertentes do Guaporé e cabeceiras dos rios: Ji-Paraná e outros no planalto do extremo ocidental daquele Estado, mostrou o “Mapa Fito fisionômico de Mato Grosso”, publicado em 1922, pela Comissão Rondon, no Rio de Janeiro.
É uma planta pequena, herbácea, as raízes são carnosas, aneladas e um tanto onduladas, chegando a ter de 20 a 40 centímetros, com flores, onde os frutos, pequenas bagas, são colhidos por um pássaro chamado “poaeiro” que, as comem e depois espalha as sementes por meio das fezes”.
A poaia foi notada pela primeira vez em Mato Grosso, no vale do Paraguai, possivelmente em um dos seus afluentes, o Areias, por José Marcelino da Silva Prado, morador de Diamantino, explorador de cascalhos a procura de ouro e diamantes, cuja proibição a partir de 1805, foi dada pela coroa real.
Após as decadências das minas, José Marcelino da Silva Prado, nascido em 1820, o sexto filho de José Pedro da Silva Prado e Maria Rodrigues de Toledo Manil, nas suas explorações do rio Areias ou Afonso pôde notar que os seus garimpeiros usavam, quando doentes, de um chá preparado de um certo arbusto, muito comum naquela região e que provocava propriedades vomitivas.
Colheu uma certa quantia e solicitou a um comerciante da Vila Maria, hoje cidade de Cáceres, que remetesse a amostra a Europa, para análise. Era o princípio da indústria extrativa da ipecacuanha, em Mato Grosso.
Corrêa Filho chama à atenção dos leitores quando informa que nessa década já havia passado por Mato Grosso, o botânico, Ludwig Riedel, que proporcionou a Luiz d´Alincourt a relação das plantas identificadas, pelo seu olhar arguto, entre elas, a poaia, a qual já existia e pagava 5% de dízimo, em 1837, ao erário provincial, advinda da sua extração no distrito de Vila Maria (Cáceres).
A ipecacuanha preferia como pátria as ribas ocidentais da Província e as cabeceiras do Guaporé e do Paraguai e Cabaçal até o Jauru, locais conhecidos como “mata da poaia”, a frondosas florestas que cobrem as margens desses rios, conforme João Severiano da Fonseca, em sua “Viagem ao Redor do Brasil”, de 1875 a 1878; mas a verdadeira mata da poaia abunda além do Rio dos Bugres, segundo, afirmava o governo de Antônio Corrêa da Costa.
Em fins de 1879, F. A. Pimenta Bueno informava que, “A indústria extrativa oferece margens para grandes resultados, mas é também contrariada pela falta de braços e de capitais, pela distância, pela dificuldade de transportes e, finalmente pela pouca segurança individual, a cada momento sujeita aos assaltos dos bugres”. “Nos distritos de Diamantino e Vila Maria até Cipotuba (hoje Tenente Lira) limitam-se à extração da poaia, cuja exportação varia segundo os preços das praças da Europa, por intermédio do Rio de Janeiro e Montevidéu”, onde estão empregados os bugres mansos da tribo Pareci.
Nesse período, a coletoria de Corumbá, registro a passagem, pelo porto fluvial, de 35.358 km, o que oficialmente correspondia ao valor de 70:810$000.
Manuel Experidião, engenheiro e colega de Corrêa da Costa apontou que “Em todas as matas do Rio Paraguai, acima da foz do Jauru, se extrai poaia há mais de trinta anos”. (…) tem-se mesmo exportado anualmente até cinco mil arrobas. De quatro anos a esta parte tem diminuído a exportação, porque aquela raiz tem-se tornado mais escassa”.
A Comissão Rondon alargaria sobremaneira a área de expansão da planta valiosa, cuja exportação, condicionada às oscilações de cotações, registra conforme abaixo:
Entre os Anos de 1928 a 1937 foram produzidas 475 toneladas de poaia ao valor de 10.721 contos de réis com 1.641 direitos em Contos de réis.
Dessa forma, Mato Grosso deixou de exercer incontestável impulso em centros científicos de nomeada mundial, para onde a destinam os exportadores, conforme conclui Virgílio Corrêa Filho.
*NEILA MARIA DE SOUZA BARRETO é jornalista, escritora, historiadora e Mestre em História. É membro da Academia Mato-Grossense de Letras (AML) e do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT).
E-MAIL: neila.barreto@hotmail.com