É preciso olhar com atenção para o bem-estar mental dos profissionais de saúde. A vivência diária com cargas horárias pesadas, exposição à dor, ao sofrimento e à morte, geram um sentimento de impotência. Esse é um cenário que faz com que esses trabalhadores acabem sobrecarregados física e mentalmente. Recentemente, vimos o caso do psiquiatra Miguel Eduardo Araújo, de 31 anos, que tirou a própria vida devido a um quadro de depressão. E esse fato deve servir de alerta para que fiquemos atentos para o que está sendo feito para evitar que outros casos extremos ocorram.
Nos artigos científicos relacionados a suicídio em médicos, as referências mostram que a taxa é maior do que em outras profissões. Este problema não começou agora, mas se agravou com a pandemia, uma vez que ela gerou um quadro de aumento do trabalho e, também, de perdas de pacientes.
A elevação de incidência de suicídio, transtornos depressivos e de abandono da carreira é justamente porque não há um retorno de acordo com tudo o que você investiu em tempo e em dinheiro. Por isso é importante a valorização. Quando fui secretário de Saúde, vindo de uma família de médicos e já conhecia as angústias da área, me preocupei em dar condições, melhorar a remuneração e reduzir a sobrecarga. Ações essas que amenizam o sofrimento e servem como estímulo.
Lá em 2005, eu já me preocupava com o bem-estar mental, porque sem que o profissional esteja bem é difícil levar atendimento de qualidade para a população. Procurei melhorar os pontos que levam ao desestímulo e à depressão e busquei manter um relacionamento mais próximo com servidores e usuários do sistema. Essa proximidade fez com que vários problemas da saúde pública fossem solucionados.
Um dos pontos corrigidos foi a remuneração. Na época, havia uma lei do prêmio saúde, mas que não era pago. Fui até o governador, na época Blairo Maggi, e conseguimos que o auxílio fosse aplicado. Com isso, alguns salários quase dobraram para médicos, enfermeiros e dentistas. Criamos ainda critérios até com relação à frequência, para evitar falta. Tudo isso gerou um aumento na procura dos profissionais para atuar no município.
Depois pensei nas condições trabalhistas. Inseri seguranças nas unidades de atendimento e garanti insumos, porque o médico precisa ter qualidade no ambiente de trabalho para exercer com plenitude o que ele sabe. Outro ponto foi ampliar o número de trabalhadores nas policlínicas para reduzir a sobrecarga. Em complemento, implantamos o plantão odontológico e reduzimos a carga de trabalho. Consegui ainda uma melhor remuneração. Tudo isso fez com que os pedidos de demissões caíssem e as faltas fossem reduzidas.
Melhoramos não só a qualidade de vida, como garantimos um atendimento melhor à população. Temos que trabalhar no sentido da valorização, para que ele trabalhe satisfeito e chegue ao trabalho preocupado em cuidar do outro de forma carinhosa. Lutei pelas condições de melhorias, porque sem isso o profissional pode entrar em quadro depressivo, procurar uma fuga no álcool e drogas e em casos extremos pode levar ao suicídio.
Esta é uma preocupação que todos nós devemos ter. Precisamos de uma atenção maior com os trabalhadores da Saúde. A pandemia transformou a todos eles em heróis. Enquanto todos estavam em casa, se cuidando, esses profissionais estavam arriscando sua vida pelo cumprimento do seu juramento. Agora é nossa vez de retribuir.
*ARAY CARLOS DA FONSECA FILHO é médico hematologista; foi deputado estadual por Mato Grosso e secretário de Saúde de Cuiabá.
CONTATO: aray.fonsecafilho@gmail.com