Ao longo de 2020 as polícias brasileiras mataram 6.416 pessoas e 5.062 delas eram negras (pretas e pardas). O número representa 78,9% do total contabilizado pela 15ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado  pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Por mês foram assassinadas 422 pessoas negras, ou seja, sete pessoas negras foram mortas a cada turno de 12 horas de trabalho das forças policiais no país. As pessoas brancas representam 20,9% das vítimas fatais. O percentual é discrepante se comparado com a composição da população do país, formada por 42,7% de brancos e 56,1% são negros, segundo a estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em 2019, o anuário apontou que as polícias do Brasil mataram 6.357 pessoas, sendo 5.028 delas negras, o que representava 79,1% do total, índice muito próximo do balanço de 2020.

 

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O relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública foi elaborado a partir das bases de dados oficiais, disponibilizadas pelos estados, sobre as mortes decorrentes de ação policial. Sobre o ano passado, o estudo revela ainda que quase todas as vítimas são homens (98,4% do total) e o perfil é majoritariamente jovem, 76,2% tinham entre 12 e 29 anos.

Essa era a faixa etária do jovem negro Thiago Duarte de Souza, de 20 anos, que morava no Jardim Limoeiro, na Zona Leste de São Paulo e foi baleado na boca por um policial militar quando foi comprar leite no dia 8 de abril deste ano.

O rapaz tinha deficiência intelectual e morreu 15 dias depois no Hospital Geral de São Mateus, também na Zona Leste. Segundo testemunhas e imagens de câmeras de segurança, ele foi atingido pelo disparo feito pelo cabo da PM Denis Augusto Amista Soares, que estava de folga no dia. O policial está afastado do serviço e aguarda a conclusão das investigações. Ele afirma que o jovem estava armado e iria praticar um assalto. A mãe de Thiago, Queli Duarte, contesta a versão.

“Desde pequeno até o começo da adolescência, ele fazia tratamento com psicóloga e psiquiatra no Hospital das Clínicas. Ele não guardava as coisas na cabeça, não sabia dizer o nome dos pais completo, endereço, nada disso. Não sabe ler e nem escrever. Ele tem 20 anos, mas é como se não tivesse. A idade mental dele era outra”, contou a mãe da vítima, em entrevista à Alma Preta Jornalismo.

Mortes violentas cresceram no primeiro ano de pandemia

Mesmo com a pandemia da Covid-19, as mortes violentas tiveram um aumento de 4% em 2020, ainda de acordo com o estudo. Esses óbitos incluem homicídios dolosos (assassinatos), latrocínios e lesão corporal seguida de morte.

A população negra é a maior vítima em todas as categorias, com índices bem acima da sua representatividade na população. Entre os assassinatos de 2020, 75,8% das vítimas foram negras contra 23,8% de brancos; nos casos de latrocínio (assassinato para roubar), 64,3% das vitimas eram negras e 34,3% eram brancas.

O levantamento nos dados dos boletins de ocorrência que registraram mortes violentas após lesão corporal intencional mostrou que 75,3% das vítimas eram negras e 24,% eram brancas.

Policiais morreram mais de Covid-19 do que assassinados

Entre os dados de policiais mortos em 2020, também é desproporcional o percentual de vítimas negras.  Foram 194 policiais assassinados, 62,7% negros  e 34,5% brancos. No ano anterior, foram 172 mortes de policiais.  A maioria dos agentes de segurança publica no Brasil são brancos (56,8%). Os policiais negros representam 42% da categoria.

“O anuário apontou que a maior parte dos polícias assassinatos foram mortos no horário de folga, fora do expediente de trabalho”, diz Sâmira Bueno, diretora-executiva do FBSP. Sete em cada dez policiais mortos no ano passado estavam de folga.

Além do risco da violência urbana, em 2020, de acordo com o estudo, a Covid-19 também teve grande impacto. Foram 472 mortes de  policiais por decorrência do coronavírus.