Atualmente o assunto mais comentado pela doutrina e decidido em ações judiciais, no âmbito da temática tributária, diz respeito à polêmica em torno da cobrança do denominado diferencial de alíquotas do ICMS, que na hipótese abordada no presente artigo é o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do estado de destino e a alíquota interestadual, devido pelo remetente da mercadoria nas operações interestaduais e recolhido antecipadamente em favor da unidade da federação, onde se encontra o adquirente, consumidor final não contribuinte do tributo estadual.
A EC 87/2015, em atendimento ao crescimento das vendas não presenciais (e-commerce), e visando beneficiar os estados consumidores, deu início a essa exigência, configurando dessa forma uma nova relação jurídico-tributária, sendo regulamentada na sequência pelo Convênio ICMS 93/2015, instrumento normativo de caráter simplesmente operacional, sem força de lei, o qual foi, também, por isso, no final de fevereiro de 2021, com repercussão geral (Tema 1093), julgado inconstitucional pelo STF (RE 1287019 e ADI 5469), ao fundamento maior de que tal pretensão dependeria de previsão em lei complementar (CF, arts. 146, III e 150, I). Na decisão a suprema corte, como sói acontecer nesses casos, visando preservar a arrecadação dos entes federativos, modulou seus efeitos para ocorrer somente a partir do ano de 2022, desconsiderando a indevida cobrança que havia ocorrido antes dessa data.
Diante dessa decisão foi aprovada pelo Congresso, em 17/12/2021, a LC 190/2022 (PLP 32/21), mas que só foi sancionada e publicada em janeiro de 2022, e desse modo apenas viabilizando sua cobrança a partir do primeiro dia do exercício seguinte ao de sua publicação, ou seja, somente a partir de 2023, ou, conforme entendimento de alguns com respaldo no RE 1221330(aplicável somente aos estados que editaram leis ordinárias regulamentando a cobrança antes da LC190/22), o tributo já poderia ser exigido após a vigência da lei complementar, desconsiderando ou relativizandoo prescrito no artigo 150, III da CF, o qual determina a observância aos princípios da anterioridade anual, plena, geral e nonagesimal, este último exteriorizadono art. 3º da própria LC, comandos que desse modo afastam os efeitos do Convênio ICMS 236/2021 que pretendeu regulamentar essa lei complementar prevendo a cobrança imediata do Difal.
Assim, de conformidade com a doutrina e de inúmeras decisões judiciais já proferidas em primeiro e segundo grau, essa exigência no corrente ano, no entendimento majoritário, se mostra inconstitucional.
A orientação que está sendo preconizada por alguns é no sentido de que os contribuintes não devem, neste momento, recolher esse ICMS-Difal, isso para evitar possível alegação por parte do fisco da necessidade de observância do que dispõe o artigo 166 do CTN (comprovação de que assumiu o encargo do tributo), uma vez que o direito de não pagar o tributo nessa modalidade ainda em 2022, já reconhecido em decisões de primeira instância e pelos tribunais estaduais, deverá ser, ao que tudo indica segundo a maioria das opiniões, confirmado pelo STF por ocasião do julgamento da ADIs 7066, 7070, 7075 e 7078, propostas, respectivamente, pela ABIMAQ, estado de Alagoas, SINDISIDER e pelo estado do Ceará, já, inclusive, com dois pareceres, da AGU e da PGR, favoráveis à observância ao aludido princípio da não surpresa, a despeito de recentes decisões de presidentes de tribunais de justiça que, preocupados com a redução da arrecadação tributária dos seus Estados, em liminar teria obstado a cobrança, mas fundamentada unicamente em alegado risco de lesão à ordem pública, conforme autorizado pela criticada Lei 8.437/1992.
*JULIANA BUENO é Advogada Tributarista na JBueno Consultores e Advogados, Consultora Tributária na Lucro Real Consultoria Empresarial, especializada em Direito Tributário, ex-assessora do Tribunal de Contas e da Procuradoria Geral do Estado de MT.
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