Você não me ensinou a te esquecer, você só me ensinou a te querer e te querendo eu vou tentando me encontrar. Já dizia a música sobre um pouco do modo como, por vezes, precisamos lidar com nossas perdas ao longo da vida.
Algumas delas são tão próprias do desenvolvimento humano e de mudanças de ciclos, que o suporte social nesses momentos tende a torná-las relativamente mais fáceis. Perdemos o agradável conforto intrauterino, os dentes da frente, a companhia da família na porta da escola, a virgindade. Outras parecem ser tão avessas a uma versão idealizada do futuro, que não é raro ser bastante desafiador enfrentá-las. Relacionamentos terminam, animais de estimação não resistem, doenças graves progridem, crianças ficam órfãs, casados adentram a viuvez.
E assim, do princípio ao fim, a gente vai tendo que aprender a lidar com a perda não apenas de coisas ou pessoas em si, mas do que elas representam para nós. Sem anestesia, nem manual, a gente vai aprendendo a viver com alguns “apesar de” ou “e se”. A gente vai se ensinando a viver de novo, e de novo e de novo, até que a própria última grande lição seja nem ser possível mais viver.
Essas tentativas de aprendizagem diante das perdas podem ser, metaforicamente, chamadas de luto. Nossos lutos são uma espécie de transição, são como movimentos de adaptação a novas realidades de vida, que geralmente nem podemos escolher. É como ser obrigado a embarcar num trem, tendo deixado algo muito importante na plataforma da estação. Muitos encontram um lugar para sentar e se acomodar; outros tentam assumir o lugar de maquinista. E, às vezes, o trem descarrila.
Por mais inevitável ou desagradável que seja, é preciso aprender não só abordar esse tema, mas também a falar e ser ouvido. Nesse sentido, grupos de apoio a enlutados e o acompanhamento psicológico, por exemplo, podem proporcionar acolhimento e escuta ativa, informações sobre aspectos comuns ao processo de luto e validação do sofrimento, entre outros objetivos.
Rumo às respostas de que precisamos, a “viagem do luto” não precisa ser tão solitária. De ausência, já basta aquelas que infelizmente não podemos controlar.
*RAUL TIBALDI é psicólogo clínico (CRP 18/04898) em Cuiabá, com aprofundamento em intervenções em situações de perdas, lutos e adoecimentos graves ou crônicos.
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