Há uma relação dialética entre ignorância, consciência, incerteza e busca da verdade. Estamos a plagiar, com algumas distorções, à Marilena Chauí. Se o ignorante não sabe que nada sabe sobre determinado assunto, continua nessa mesma situação pessoal e intelectual, podendo daí transformar seu triste infortúnio num arroubo de mais ignorância, desta feita em cima dos outros. Com esse tipo o melhor é não discutir, não se gasta energia com eles.
Por outro lado, se o ignorante sobre determinado assunto, após suas reflexões, chega à conclusão que nada sabe sobre ele, a sua situação pessoal e intelectual transmuda-se pela consciência. Disso resulta um estado de incerteza e inquietação, levando-o a avançar em seus estudos e meditações. Agora, temos o ignorante, consciente de sua estatura intelectual sobre um singular assunto, na busca da verdade. Está caminhando e, caminhando, conhecendo.
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Refletindo sobre ética, Kant sintetizou muito bem, ao externar o ideal de não fazer nada que não se possa revelar aos outros. Se algo não possa ser revelado, não o faça. Simples, assim. Pois bem…, meditando sobre a violência em nosso Estado, que é tão generoso, por sinal, fazendo jus a seu tamanho, tolerando um “no Mato Grosso” quase que diariamente em interfaces sociais, me deparei com os estudos de José Flávio Braga Nascimento sobre criminologia. A ignorância, portanto, nos faz caminhar quando a reconhecemos, ea ética a socializar aquilo que não nos envergonha, antes, alerta.
Essa ignorância se faz acompanhar de alguns entendidos sobre a criminalidade que a todos assusta e assombra.
As teorias psicodinâmicas e as psicossociais nos ajudam a entender um pouco dos fenômenos criminológicos. A primeira (desenvolvida por nomes como Freud, Adler e Jung) se baseia em três princípios: o homem é por natureza um ser antissocial, a causa do crime é em última instância – social, e durante a infância que se forma a personalidade. Aqui se leva em consideração a má formação do ego pelo desequilíbrio da atuação do id e superego no indivíduo, com preponderância do primeiro.
Chama bastante atenção a segunda teoria, também chamada de crítico-radical. Nesta, o sentimento profundo por parte do indivíduo antissocial, por não ser gratificado pela sociedade, funciona como gatilho a desencadear o ato final e criminoso. Veja, a pessoa já detém a classificação de antissocial. O que vem depois é o acionamento da condição pela qual o delinquente não tem qualquer controle. É um sentimento de frustração, a consciência de que não pode realizar seus sonhos. Se não pode, busca a verdade, o sentido da vida; e, ao não encontrar, até por faltar-lhe estrutura dialética no pensamento (base educacional, de cidadania), realiza as contradições, inclusive inconsciente, que carrega em mácula de sua vestal, vertente sombria de sua personalidade.
A tudo me faz lembrar Voltaire – “Vossa vontade não é livre, mas vossas ações o são. Sois livres de fazer quando tiverdes o poder de fazer” -. É uma questão de poder. E quem vai apear do poder (ainda que passageiro, momentâneo) àquele que ostenta uma arma contra a sua vítima? Nesse instante, ele, o criminoso, é o poder. Isso o torna membro de um grupo que o arma e lhe dá confiança, enquanto a sociedade assiste a tudotrancada na própria inoperância. De assistente mesmo à espera de alguém que limpe a sujeira, que aceite se igualar e se lambuzar na lama da violência.
É por aí…
*GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO (Saíto) é formado em Filosofia e Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT); é membro da Academia Mato-Grossense de Magistrados (AMA), da Academia de Direito Constitucional (MT), poeta, professor universitário e juiz de Direito na Comarca de Cuiabá. E é autor da página Bedelho Filosófico (Face, Insta e YouTube).
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