Wagner Pires de Sá não faz mais parte do conselho deliberativo do Cruzeiro. A exclusão do empresário e ex-presidente do clube foi decidida nesta segunda-feira, mais de dois anos depois de ele renunciar ao cargo máximo da administração da Raposa, após uma série de irregularidades apontadas em sua gestão.
Dos 136 conselheiros que compareceram à assembleia, na noite desta segunda-feira, na sede do Barro Preto, em Belo Horizonte, 113 decidiram pela exclusão de Wagner Pires do quadro de beneméritos. Outros vinte votaram pela permanência do ex-presidente. Houve dois votos nulos e um em branco.
A imprensa não pode acompanhar a reunião do conselho deliberativo, assim como a leitura do relatório da comissão de ética e a apresentação da defesa por parte do ex-presidente. A entrada foi liberada após a apuração dos votos. Nagib Simões, presidente do conselho deliberativo, considerou baixo o número de presentes, mas comemorou o resultado.
– O número de presentes foi um pouco baixo devido à chuva e à pandemia, então há de se levar (em conta). Mas o resultado foi dentro das expectativas. Acho que é o momento em que o conselho deliberativo marcou atuação séria, honesta e sincera que sempre deve ter. Daqui para frente, é procurar fazer tudo dentro da lei.
Wagner Pires de Sá ainda é réu em processo criminal instaurado em novembro de 2020. O ex-dirigente foi denunciado pelos crimes de falsidade ideológica, apropriação indébita e formação de organização criminosa.
A caso corre ainda na Justiça, em segredo, sem julgamento do mérito. O ge consultou o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mas ainda não teve retorno. Em janeiro, houve expedição de mandados pelo juiz do caso.
O dirigente também é investigado em outro braço do inquérito da Polícia Civil de Minas Gerais. Nele, há apuração sobre negociações de atletas durante a gestão de Wagner Pires de Sá. Os policiais trabalham com a investigação em segredo e ainda não concluiram a fase de diligências.
O processo no conselho
Em novembro, o ge trouxe com exclusividade os detalhes do processo (com 459 páginas) do ex-presidente. Dos 18 itens apontados na representação inicial contra Pires de Sá, a comissão de ética e disciplina considerou metade delas, qualificando-as como “graves” alguns atos do ex-dirigente. São eles:
- Favorecer o filho ao empregá-lo e remunerá-lo no Cruzeiro
- Outorgar poderes “amplos e ilimitados” a Itair Machado, sem exigir prestação de contas, “cujos excessos praticados contribuíram para a insolvência do clube”
- Utilizar cartão corporativo para compras pessoais
- Incluir o clube como devedor solidário da dívida de R$ 10 milhões de Fred com o Atlético-MG
- Omitir ganhos excessivos na intermediação da venda de Mayke ao Palmeiras
- Aumentar em “valores vultuosos” as despesas do clube
- Remunerar com altos valores – “fora do habitual de mercado” – funcionários e dirigentes, além de conselheiros (que não poderiam ser remunerados)
- Autorizar o pagamento de mais de R$ 500 mil a Itair Machado por “fator gerador ocorrido antes da posse”
- Ceder a marca Cruzeiro ao Instituto Cinco Estrelas pelo valor de R$ 20 mil em 24 parcelas
Dentre as alegações não consideradas, duas foram citadas no relatório. A primeira de “desrespeito à instituição Cruzeiro”, por uma declaração no fim de 2019. A outra diz que não foi constatada intervenção de Wagner Pires na autonomia do conselho fiscal.
Wagner Pires de Sá esteve no comando do Cruzeiro entre 2018 e 2019, antes de renunciar ao cargo — Foto: Bruno Haddad/Cruzeiro
Das alegações consideradas, foram anexados, por exemplo, os extratos de remuneração do filho de Wagner Pires, Humberto de Sá. Ele, inclusive, acionou o Cruzeiro na Justiça do Trabalho. Também estão incluídos os extratos dos cartões corporativos do clube, o contrato de mútuo com o empresário Cristiano Richard, além de documentos assinados por Itair Machado quando gestor do Cruzeiro.
A defesa de Wagner
Wagner Pires de Sá apresentou defesa em 22 de julho deste ano sobre as alegações. De maneira resumida, estes foram os argumentos dentro da investigação no Cruzeiro:
- Sobre o filho de Wagner Pires: a defesa informou que Humberto Pires de Sá possuía “capacitação compatível” para as funções pelas quais foi contratado, que o filho “revitalizou a Toca I, que se encontrava deteriorada”, e que Humberto foi remunerado de acordo com os valores praticados no mercado.
- Dos poderes de Itair Machado: defesa argumentou que as condições estavam dentro do regulamento geral do Cruzeiro
- Cartão corporativo: Wagner Pires argumenta que não existem provas e notas fiscais do “alegado consumo pessoal”. Ainda disse que as contas da gestão foram aprovadas pelo conselho deliberativo.
- Contratação de Fred: “se deu dentro dos valores de mercado”. A defesa argumentou que a contratação ocorreu em meio a uma grande oportunidade. Caracterizou a inclusão do fato como “oportunista”.
- Pagamento de intermediação na venda de Mayke: argumentou que era preciso contratar uma “empresa intermediária para viabilização do negócio”.
- Aumento de despesas: a defesa aponta que Wagner “sofreu consequências de décadas de administrações temerárias. Alegou que as contas da gestão foram “chanceladas” pelo conselho deliberativo.
- Altos valores pagos a funcionários e dirigentes: a defesa alega que as quantias eram “compatíveis” aos praticados pelo mercado
- Valores pagos a Itair Machado por serviços de 2017: a defesa argumenta que “os poderes conferidos” a Itair foram dentro do limite do regulamento do Cruzeiro.
- Venda da marca Cruzeiro ao Instituto Cinco Estrelas: Wagner afirma que não houve irregularidade e que o “direito de uso da marca foi regularmente adquirido e devidamente pago” e que não houve concessão de uso vitalícia.
Após a apresentação do relatório ao conselho deliberativo do Cruzeiro, a defesa do ex-presidente pediu uma nova produção de provas (periciais e testemunhais). O pedido da defesa do ex-presidente foi realizado em 25 de outubro do ano passado e deferido em novembro.
Wagner Pires de Sá ainda é réu em processo criminal instaurado em 2020 — Foto: Bruno Haddad/Cruzeiro
Wagner apresentou o pedido para colher provas testemunhais de seis conselheiros natos da Raposa: Lúcio de Souza, Paulo Roberto Lopes Soares, José Galvão Silveira, Eliezer de Sousa Mattos, Délcio Pinto da SIlva e Guilherme Oliveira Cruz.
Este foi um dos motivos para que o processo não fosse avançado. Outro motivo também foi os problemas internos dentro da comissão de ética e disciplina. Depois de ser afastado, o então presidente da comissão de ética e disciplina do Cruzeiro, Fernando Torquetti, renunciou ao cargo. (GE)