Em sua apresentação como técnico do Corinthians, na manhã desta terça-feira, Sylvinho detalhou seus planos no comando da equipe, comentou a rápida negociação com a diretoria alvinegra, disse estar pronto para o desafio na carreira e reconheceu seu lado “pilhado”.
Mas nem seria necessário Sylvinho falar sobre essa características, que ficou evidente durante os quase 50 minutos de entrevista. Inquieto na cadeira, o técnico agitou pernas e mãos na maior parte do tempo e mostrou que não é elétrico apenas dentro de campo:
– É um jeito, característica. Não gostaria de ser assim, tem hora que me incomoda. Meus pés se mexem. Ser pilhado no futebol é não perder tempo. Não temos tempo a perder. Nível de concentração alto. Entrega. Concentração. Estar atento a tudo, absorvendo tudo. O atleta é inteligente. Sou pilhado porque entendo que as coisas são assim, é meu ritmo. Sempre serviu para mim. Na vida cotidiana, eu passo um pouco do ponto. É muita energia – declarou.
Técnico Sylvinho recebe a camisa do Corinthians das mãos do presidente Duilio Monteiro Alves — Foto: Rodrigo Coca/Ag. Corinthians
Sylvinho assinou contrato com o Corinthians até o fim de 2022. Segundo ele, a negociação com o clube foi rápida e ele não hesitou em aceitar a proposta:
– Não precisei consultar ninguém. Vim porque é hora, porque é tempo. Estava esperando. Tenho monitorado. É um clube que conheço há muitos anos. Foram três minutos de uma boa conversa. Trago do Lyon construção enorme na vida, e em outras funções, até mesmo nessa casa (como auxiliar). Trabalhei com Tite e Mano Menezes. Trago muita coisa, conteúdo, e isso me deixa muito satisfeito. Trago de todos.
– O presidente e a diretoria do Corinthians me ligaram, duvido que achassem que eu não estava pronto. Estou pronto para essa massa que é o Corinthians.
O treinador afirmou que acompanhava o Timão a distância e que vem estudando o elenco desde domingo, quando fechou com o clube. Ele também deixou claro que espera poucas contratações:
– O clube já tem muito claro, assim como eu, que não teremos muitas vindas de reforços. Vejo um cenário de atletas com boas condições, sim. Entendo que tudo pode ser potencializado e melhorado. Passa por etapa, e estamos vivendo uma nova. O Corinthians está acostumado com títulos. Mas a etapa é nova, de construção. Paciência, ter os jovens, mais experientes, juntar forças. Com raça, dedicação, que é o mínimo que podemos dar ao nosso torcedor.
O novo comandante alvinegro estava vivendo em Portugal e chegou ao Brasil na manhã desta terça, horas antes da apresentação.
Sylvinho assistirá de um camarote da Neo Química Arena à partida entre Corinthians e River Plate-PAR, quarta-feira, às 21h30, pela Copa Sul-Americana – o Timão já está eliminado. A estreia à beira do campo será domingo, na primeira rodada do Brasileirão, contra o Atlético-GO, às 18h15, em Itaquera.
Aos 47 anos, Sylvinho terá sua segunda experiência como treinador. Na primeira, pelo Lyon, em 2019, ele comandou o clube francês por apenas 11 jogos antes de ser demitido.
Revelado na base do Timão, como jogador ele conquistou a Copa do Brasil de 1995, o Brasileirão de 1998 e o Paulistão de 1995, 1997 e 1999.
– Fiquei muito tempo fora do país, mas sempre de olho aqui. Com relação a títulos, a gente sempre aprende com muitas coisas. Em 98, o Brasileiro, excepcional o título. Chegamos muito bem no campeonato. O título de 95 me remete a situações que são a cara do clube. Reconhecer a superioridade de um Grêmio, de um Palmeiras, mas éramos um time. Entendíamos o que queríamos. Ficou realmente na memória. No profundo do coração. Os da Europa nem vale tocar, foram bonitos e muito valorizados – comentou.
Também em 2016, ele foi cotado para assumir o cargo de técnico do Corinthians na gestão de Roberto de Andrade, hoje diretor de futebol, mas optou por seguir na Europa para terminar cursos da Uefa. Na ocasião, ele trabalhava como auxiliar da Inter de Milão.
Ele também passou por Cruzeiro e Sport como auxiliar, curiosamente de Vagner Mancini, treinador demitido do Corinthians após a eliminação no Paulistão.
Sylvinho chega ao Timão junto do auxiliar Doriva, que já foi técnico de alguns clubes, como São Paulo e Vasco.
– O cenário é positivo. Fernando Lázaro (analista de desempenho) está de volta ao clube. Tivemos conversa, informação. Trago o Doriva, profissional de alto nível. Traz experiência, tranquilidade. Já estamos trabalhando em cima do elenco, de decisões a serem tomadas. Vamos acelerar processos. O campeonato está aí, vai começar rapidamente. Temos dificuldade da pandemia. O respaldo é bom, a equipe é boa. Vamos trabalhar. Vi alguns jogos do Paulista, entre tantos outros. Jogos de domingo, terça, quinta, misturados com outros campeonatos é muito complicado. Temos que relativizar. Temos uma nova etapa.
Veja outros trechos da entrevista de Sylvinho:
Esquema tático / Três zagueiros
– Variação de sistema tático existe e é bom. Gosto de linha de quatro, conheço o sistema, domino as funções. Podemos trocar sistemas, ocorre. Mas os atletas me conhecem. Faz parte da história do Corinthians a linha de quatro. A garra e a raça são marcas desse clube. Não será difícil.
Mais sobre tática
– O sistema tático não define se o time é ofensivo ou defensivo, mas sim as peças e o que queremos potencializar. Eu domino o sistema de quatro, fui criado assim. 3-4-1-2 e outros sistemas com três, também dominamos. Precisamos entender o que potencializa o time e os jogadores. Não gosto de variação de sistema, não trabalho assim. Entendo que o atleta treinado tem as distâncias e percepções de treino para levar para o campo com tempo de trabalho. Variação te causa distâncias diferentes, o que gera atraso. Eu gosto da linha de quatro, mas não está fora de cogitação trabalhar com linha de três em algum jogo pontual.
Sylvinho, novo técnico do Corinthians, em sua apresentação — Foto: Rodrigo Coca/Ag.Corinthians
Trabalho com a base
– O trabalho é desafiador e árduo. É recuperar os mais experientes. Eu trabalho para todos os atletas. Nós da comissão, da direção, todos nós trabalhamos para recuperar os atletas. Os jovens, também. Quanto a eles, é importante acelerar algumas etapas. É uma demanda do futebol, dos jogos. É bom trabalhar com jovem, tem absorção, mas com responsabilidade de colocá-los e que se sintam melhor pouco a pouco. Alguns são mais rápidos, quem dá o tempo são os atletas. Temos que recuperar a todos. Não me conformo em deixar dois fora. Vamos buscar os atletas.
O que é inegociável para você?
– Eu tenho bastante coisa inegociável. Tem coisas indiscutíveis no futebol: perda de tempo, nível baixo de concentração. Vai subir. Isso é trabalho, dedicação. Somos exemplos para uma sociedade. Representamos nação, torcedores. Respeitar a geração, a idade, a juventude. Há tempo para tudo. Passei por isso e entendo.
Referências táticas
– Cada técnico tem uma característica. Absorvo o melhor de cada um deles. Sou o Sylvio. O jogo é de uma competitividade maravilhosa. É fascinante. Falamos em linhas altas. Mas se o rival tem a bola e você não pressiona bem, vai ter que correr para trás. No primeiro livro do Guardiola, 4-4-2 é número de telefone, porque as peças se mexem. Todos gostamos de marcação pressão, posse de bola, linhas altas. Vamos ver o que o grupo dá para poder encaixar tudo isso. Saber quando e por que temos que retroceder, marcar o espaço. Duas formas de marcar: marcar o homem ou espaço. A bola passa no espaço. Variável fina. É muito bonito jogar com essas coisas.
Prós e contras de ser “pilhado”
– Sinceramente, eu só vejo bônus. Volto a dizer para você, tenho construção de carreira. A expectativa muito alta. Com trabalho, com cenário que tenho aqui. Volto a dizer: o Corinthians é impressionante. O Corinthians mexe com multidões. É maravilhosa a massa, acostumamos com isso. Trago uma situação do Corinthians: chegar no Pacaembu duas horas antes e ele já estar lotado. A partir dali, as coisas ficam mais fáceis. Conhecemos isso, a casa é assim e a casa é boa.
Período desempregado
– Nós não ficamos sem trabalhar. Vinha conversando com alguns treinadores. É uma pena pela pandemia, porque gosto de visitar locais. São 13 ou 14 jogos no fim de semana, construções de carreira de treinadores jovens. São muitas coisas. Não tem o campo, concordo contigo. Tenho vantagem muito grande. Minha família sabe: quando estou trabalhando, é trabalho. Fora do trabalho, sei passar o tempo com a minha esposa. Não sou murmurador. Não fico esperando semana que vem acontecer algo. Gostei de me identificar com os clubes pelos quais passei. Tenho portas abertas. Não fico me agoniando por não estar no campo. Esqueço a família. Agora aqui é trabalho.
Vai priorizar alguma competição?
– Não vamos priorizar nada. Prioridade é o próximo jogo. O tempo é escasso. Guarda combustível antes do jogo, depois, recupera. Dá para se trabalhar. Assim eu aprendi com grandes treinadores. As imagens falam mais do que palavras. Metologia sendo desenvolvida com imagens. Otimizar tempo, ganhar tempo para poder ir aperfeiçoando o que queremos do atleta. As imagens falam. Trabalhamos com isso. Dentro de um grupo, com imagem de cinco a sete minutos, aquilo ali é treino. Vai ser levado a campo. É um processo desafiador, mas temos que nos encontrar. (Globo Esporte)