Há um ano atrás o Brasil passou a conviver com a pandemia do coronavírus. Isolamento social, quarentena, máscaras, álcool, lockdown, e por aí afora, foram palavras presentes com maior frequência em nossas vidas. As mulheres se reinventaram com o ‘novo normal’, ficando, mais uma vez para elas os ônus da anormalidade. A violência dantes por elas vivenciada ganha outros ‘ares’.

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Não, diferentemente dos homens, o tal ‘novo normal’ as fez estar no que para elas sempre se tentou normalizar. O trabalho dentro dos lares, como sempre aconteceu, as apresentou menor qualidade de vida. Se antes o ambiente doméstico a elas pertencia, agora muito mais e com maior carga de responsabilidade.

 

De outro turno, a violência doméstica e familiar é uma realidade na vida de muitas, com a diferença de que elas não tiveram trégua, dado ao isolamento social.

Tiveram que aturar algumas situações:  homens nervosos as agredindo pela proximidade maior; homens nervosos pela dificuldade com o trabalho; homens nervosos por terem que ouvir a voz delas com maior frequência; homens nervosos por terem bebido em demasia; homens nervosos com choros dos filhos e filhas; homens nervosos por terem que contribuir com a limpeza de casa; homens nervosos pelo almoço ou jantar não estar pronto; homens nervosos por não terem paciência com qualquer mulher. Ah, e os homens nervosos, por serem nervosos.

 

Fora do ambiente de casa, durante o período pandêmico, mulheres foram assediadas. Eles assediaram por ser da natureza deles; eles assediaram por não aguentar ver um corpo de mulher; eles assediaram por terem visto em reuniões virtuais mulheres ‘provocantes’; eles assediaram por ‘acharem’ ter controle sobre o corpo feminino; eles assediaram por entender serem elas apenas objetos de satisfação de seus desejos. Enfim, assediaram, por serem assediadores.

 

No tal “novo normal”, o que houve de diferença substancial na vida delas? Algumas ficaram a realizar um labor maior? Algumas ganharam mais responsabilidade que outras?  Quem sabe umas sofreram mais que outras? Quem sabe tiveram mais problemas para buscar ajuda? Quem sabe não sentiram a efetividade das leis que as protegem? Ficaram amedrontadas por pedir ajuda? Esperaram que em alguns dias eles passassem a respeitar, mudando de comportamento? Esperaram que eles passassem a pensar na família com mais amor e deixassem de praticar a violência?

 

Há um ano, o mundo se preocupou com a COVID-19. Já as mulheres se preocuparam e se preocupam com o novel vírus, e, ainda, com a pandemia da violência que as assola em todos os lugares. Elas, de novo, tiveram que se habituar a outras situações. Elas não conseguem ter qualquer descanso ou sossego, seja no período pandêmico ou não.

 

Em 2020 o mundo se modificou. A cada vez que inovações ocorrem, as primeiras a sentirem os reflexos são elas, as mulheres…

 

Em casa, nas ruas, no ambiente virtual, e onde quer que elas estejam, não viveram o tal ‘novo normal’. Quem sabe viveram e estão a viver o ‘mesmo normal’ com pitadas de maior crueldade e desamor.

 

*ROSANA LEITE ANTUNES DE BARROS é defensora pública em Mato Grosso.

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