O recado foi dado assim que Mike Tyson deixou o ringue. Ainda ofegante, mas com um sorriso de garoto no rosto, o pugilista de 54 anos pouco parecia se importar com o empate simbólico com Roy Jones Jr.. Já àquela altura, o veterano tinha a certeza: a luta de sábado no Staples Center não seria um ponto final.
– Com certeza, eu vou fazer isso de novo.
– Eu não sei. Talvez façamos algo no sul da França, Mônaco, na parte central. Fazemos algo lá fora. Um dos lutadores europeus por aí, é possível. O céu é o limite. Eu acredito que o evento quebrou todos os recordes em pay-per-view. Eu só quero continuar a fazer isso, de uma perspectiva humanitária.
Mike Tyson em ação contra Roy Jones — Foto: Joe Scarnici/Getty Images for Triller
O pugilista evitou citar nomes de possíveis novos rivais. Garante, porém, que espera seguir subindo aos ringues – e em um número maior de vezes.
– Eu já tive 15 lutas em um ano. Então, vamos tentar trabalhar mais perto disso. Tem que ser competitivo, que seja um cara constante. Não pode ser alguém fora de forma, não seria consistente. Eu gostaria de ter uma luta a cada dois meses.
Tyson afirma que, durante todo o tempo, o nocaute não era o seu maior desejo na luta contra Roy Jones Jr.. De volta aos ringues, tudo o que o pugilista queria era não cair antes do tempo.
– Eu só estava feliz de estar ali com ele e de ter conseguido chegar ao oitavo round. Pontuar não significava nada pra mim, ausência de fãs não significava nada para mim. Eu só estava feliz por ir longe. Isso é um lutador real, ter resistência. Você não vai nocautear todo mundo. Eu aprendi isso.
– Eu me sinto ótimo agora. E isso é diferente de apanhar. Estou acostumado a apanhar, acostumado com esse sentimento. Sou capaz de ajudar muitas pessoas, menos afortunadas do que eu. Isso é o que sou capaz de fazer em todo o mundo, em um mundo perfeito. Em um mundo perfeito, eu seria um missionário. O que estou fazendo no ringue, percebi que é um presente. Não só para mim. Antes, era tudo sobre mim, uma mulher sexy e um bom carro. E os aviões e os barcos. E isso não serve mais para mim. Eu fui por outro caminho.
Como foi a luta
Mas, em seu retorno aos ringues após 15 anos, Mike Tyson mostrou lampejos do homem que assombrou o boxe há três décadas. Durante todo o confronto contra Roy Jones Jr., outro veterano aos 51, o pugilista buscou o ataque, mas o nocaute não veio. Neste sábado, no Staples Center, em Los Angeles, Jones conseguiu segurar qualquer tentativa de Tyson de dar um resultado à luta de exibição de pesos-pesados. No fim, de acordo com o protocolo do evento, os dois foram declarados campeões. Um empate simbólico, quase uma homenagem aos cinquentões.
Por ser uma luta de exibição, não houve contagem de pontos. Cada um dos oito rounds teve apenas dois minutos de duração. Tudo para tentar manter a integridade física dos dois pugilistas. Tyson, porém, foi mais agressivo e tentou o nocaute a todo instante, mesmo quando o cansaço batia. Do outro lado, Jones, que sempre foi conhecido pela rapidez de seus movimentos, freou o rival e amarrou a luta sempre que pôde. No fim, os dois festejaram a possibilidade de subir ao ringue uma vez mais.
– Eu estou feliz com isso (um empate). Eu acho que consegui entreter as pessoas, as pessoas estão felizes comigo. Às vezes esse dois minutos (por round) parecem três (risos). Com certeza, vou fazer isso de novo. Estou tão feliz de ter ido até o oitavo round. Nocaute não significaria nada. Para mim é mais significativo conseguir lutar oito rounds, saber que poderia lutar dez – disse Tyson após a luta.
Mike Tyson ataca Roy Jones Jr — Foto: Joe Scarnici/Getty Images for Triller
Mike Tyson e Roy Jones Jr. com os cinturões simbólicos — Foto: Joe Scarnici/Getty Images for Triller
Tyson agride, Jones segura
Foram 15 anos longe de seu habitat natural. Neste sábado, Tyson voltou aos ringues e tentou reviver os melhores dias de sua carreira. Na subida ao ringue, a tensão estava estampada no rosto dos dois pugilistas. Ao soar o gongo para o início, Tyson tomou a iniciativa e partiu para o ataque contra Jones. Ainda que não houvesse contagem de pontuação, Tyson mostrou força e dominou o primeiro round.
Já no segundo assalto, Roy Jones Jr. parecia cansado. A todo momento, buscava o clinch e tentava escapar dos golpes de Tyson. Ainda assim, conseguiu encaixar um jab, mesmo que não tenha afetado tanto o rival. Logo, Tyson também se mostrou cansado. A cada tentativa de agredir, Jones buscava o abraço, amarrando a luta.
Roy Jones Jr. buscou sempre amarrar a luta — Foto: Joe Scarnici/Getty Images for Triller
No quinto round, Tyson achou o caminho para atingir Jones. O pugilista conseguiu uma boa sequência de golpes, e o rival pareceu sentir mais, mas conseguiu se manter de pé. Foi assim até o fim. No último dos oito rounds, Tyson partiu para cima e fez a tentativa derradeira de um nocaute que não veio. No encontro de lendas, ninguém saiu vencedor.
Mike Tyson é considerado um dos maiores nomes do esporte de todos os tempos. Ao aliar talento e polêmicas, o boxeador se transformou em uma espécie de ícone da cultura pop – para o bem e para o mal. Com um cartel de vitórias emblemáticas e derrotas catastróficas, Tyson estava longe dos ringues desde 2005, quando foi derrotado pelo irlandês Kevin McBride.
Com apenas 20 anos, Mike Tyson tornou-se o mais jovem campeão mundial dos pesos pesados e construiu um cartel impressionante ao longo da carreira. Foram 58 lutas, 50 vitórias e 44 delas por nocaute.
Mike Tyson tenta acertar golpe em Roy Jones Jr. — Foto: Joe Scarnici/Getty Images for Triller
Roy Jones Jr., por sua vez, é conhecido como Capitão Gancho, por conta da potência de seu golpe. Ele tem 66 vitórias, sendo 47 nocautes, e nove derrotas. Seu último embate havia sido em 2018, em triunfo contra o compatriota Scott Sigmon. Ele é ex-campeão dos médios e dos super-médios. Mas se destacou mesmo na categoria dos meio-pesados, conquistando o cinturão das principais organizações do boxe. Em 2003, ele chegou a recusar uma luta milionária contra Mike Tyson. O pugilista ainda soma uma prata olímpica, conquistada em 1988, nos Jogos de Seul.
Antes de luta, ex-astro da NBA leva surra de youtuber
Entre os coadjuvantes da noite, o embate mais aguardado foi logo antes da luta principal. Ex-astro da NBA, Nate Robinson não foi páreo para o youtuber Jake Paul e foi nocauteado logo no segundo round, depois de ir ao chão outras duas vezes.
A luta dos dois começou tensa, com os dois buscando o clutch todo o tempo. Os dois ainda foram alertados pelo juiz: “Não é wrestling”. Jake Paul, porém, mostrou força ao acertar um cruzado de direita no rosto do ex-jogador da NBA. No segundo round, o youtuber voltou a derrubar Robinson com um novo cruzado. O rival levantou, mas foi à lona mais uma vez com o mesmo roteiro. Um nocaute com autoridade antes da principal luta da noite.
A noite não foi apenas de lutas no Staples Center. Em um evento com a intenção de servir como entretenimento, astros da música também fizeram parte. Wiz Khalifa e Snoop Dogg tomaram o palco antes da luta principal e serviram de esquenta. Antes de Tyson e Roy Jones subirem ao ringue, Ne-Yo cantou o hino americano e terminou erguendo o punho em um ato antirracista.
Snoop Dogg subiu ao palco antes de luta entre Tyson e Roy Jones — Foto: Reprodução
Fora dos ringues, Tyson coleciona polêmicas e já foi preso por estupro
O adolescente problemático se transformou em uma lenda do boxe. Com apenas 20 anos, Mike Tyson tornou-se o mais jovem campeão mundial dos pesos pesados e construiu um cartel impressionante ao longo da carreira. Foram 58 lutas, 50 vitórias e 44 delas por nocaute. Mas a trajetória do boxeador também foi marcada por muitas confusões, polêmicas e crimes. Em 1992, foi condenado a seis anos de prisão por abusar sexualmente da miss Desiree Washington. Cumpriu metade da pena e foi liberado em março de 1995 devido ao bom comportamento.
Após ser solto, Tyson voltou a lutar e vencer. Pouco tempo depois, em 1997, protagonizou um dos episódios mais agressivos da história do boxe ao morder a orelha de Holyfield durante uma luta, sendo desclassificado e banido por um ano das competições. Fora dos ringues, seguiu tendo passagens pela polícia por acusações de agressões e porte de drogas. Um desses episódios foi no Brasil, em 2005, quando agrediu um cinegrafista e foi detido. Neste mesmo ano, depois de duas derrotas, se aposentou do boxe. (Globo Esporte)