O Cruzeiro entrou com uma contestação na 1ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, requisitando a retomada do contrato desportivo com o atacante Fred e a queda da medida cautelar que o liberou para acertar com o Fluminense. No documento anexado, o clube ainda requisitou que os ex-dirigentes, Wagner Pires de Sá (ex-presidente) e Itair Machado (ex-vice-presidente de futebol) sejam incluídos no processo como “polo passivo” e que tenham responsabilidade solidária na ação.
A informação foi publicada inicialmente pelo site Esporte News Mundo e confirmada pelo GloboEsporte.com, que teve acesso ao inteiro teor da contestação. O Cruzeiro pede que a reclamação inicial de Fred seja declarada inepta e que o processo seja extinguido sem a resolução do mérito.
No argumento do escritório de advocacia que defende a Raposa, o jogador apresenta pedidos “genéricos e sucintos” e “com clara ausência de pedir, impedindo “o pleno exercício do direito do contraditório e do defesa do reclamado”
Atacante Fred assinou com o Cruzeiro na antevéspera do Natal de 2017, quando o imbróglio começou — Foto: Vinnicius Silva/Cruzeiro
O Cruzeiro pede também que o contrato de trabalho seja validado novamente até que a reclamação de Fred seja concluída na Justiça. Para isso, o clube afirma que o argumento usado por Fred (concessão de atestado liberatório de seu passe, para que possa transferir-se para outra entidade de prática desportiva de mesma modalidade, nacional ou internacional, bem assim, declarando rescindido seu contrato de trabalho com o requerido) não encontra vigência na atual legislação por dois motivos:
- não mais existir a figura do “passe” e por não haver embasamento na atual legislação de pedido de outra agremiação para liberação de atleta.
Sem discordância
O Cruzeiro também argumenta que o pedido de rescisão indireta por parte de Fred não é válido. Segundo o clube, no momento em que começou a passar por sérias dificuldades financeiras e atrasos salariais, optou por “arcar com o pagamento de salários dos servidores que ganhavam menos, deixando o pagamento do Reclamante sofrer um atraso parcial, com o que jamais houve qualquer discordância por sua parte”. Na opinião do Cruzeiro,
Não existe prejuízo considerável para o Reclamante, pois apenas os últimos meses de salário não foram pagos em sua totalidade, o que não pode caracterizar a falta grave do empregador
Ainda sobre o pedido de rescisão, o Cruzeiro questiona a defesa de Fred o porquê de a ação só ter iniciado após o rebaixamento do clube à Série B e não já a partir de abril de 2018, quando o clube mineiro passou a não cumprir todas as cláusulas do acordo com o atacante do Fluminense. O pedido, na conclusão dos argumentos da Raposa, seria um subterfúgio para o jogador acertar com o Tricolor e receber o que lhe era devido.
Pedido de anulação de compensação
O clube mineiro ainda pede que a cláusula 9.2 do contrato entre a Raposa e Fred seja anulada por “afronta à boa fé objetiva, sendo portanto inaplicável”. A cláusula trata da compensação em caso de rescisão, que está no valor de R$ 50 milhões e é pedida por Fred na ação. Isso porque o clube considera a rescisão indireta inválida, o que deixaria sem razão a discussão do pagamento do valor.
A defesa do clube mineiro ainda alega que Fred, ao abrir mão da multa dos R$ 320 milhões, deixou a cargo do poder judiciário o valor da multa (o que poderia ser de até 50 milhões, mas não necessariamente os R$ 50 milhões).
Para o Cruzeiro, “a manutenção da aludida cláusula resultaria apenas em enriquecimento sem causa”, já que Fred tem contrato ainda com o clube mineiro, o que geraria um enriquecimento ilícito, no argumento da defesa cruzeirense.
Responsabilidade de dirigentes
O Cruzeiro, como em outros processos que vem movendo, argumentou sobre a responsabilidade solidária de ex-dirigentes. Entre outros argumentos, o clube citou o parágrafo 11 do artigo 27 da Lei Pelé, que estabelece que: “os administradores de entidades desportivas profissionais respondem solidária e ilimitadamente pelos atos ilícitos praticados, de gestão temerária ou contrários ao previsto no contrato social ou estatuto”.
O clube argumenta que houve gestão temerária e incumprimento de artigos do estatuto do clube, concluindo que ficou “caracterizado a inobservância dos princípios da transparência financeira administrativa; moralidade na gestão desportiva e responsabilidade social do dirigente.
Fred, com a camisa do Cruzeiro, com o empresário, o diretor de futebol e o presidente do Cruzeiro — Foto: Divulgação / Cruzeiro
- Em dezembro de 2017 o Reclamado contava com um déficit de R$17.000.000,00 (dezessete milhões de reais) e, sem nenhuma receita extraordinária prevista firmou contrato com o Reclamante com a previsão de uma cláusula compensatória no valor de R$320.000.000,00 (trezentos e vinte milhões de reais). É imperioso destacar que uma das causas geradoras da exigibilidade do pagamento dessa astronômica quantia seria a impontualidade dos pagamentos dos direitos desportivos do Reclamante, capaz, inclusive, de gerar rescisão indireta do contrato de trabalho. Esse ato, por si só, representa um altíssimo grau de irresponsabilidade administrativa que colocou o Reclamado em situação de alta vulnerabilidade e risco concreto de descontinuidade de suas atividades desportivas
- O referido déficit, entretanto, foi majorado em dezembro de 2018 para o valor de R$ 303.000.000,00 (trezentos e três milhões de reais) em mais uma clara demonstração de descontrole administrativo e absoluta má-gestão
- Na gestão dos chamados à lide, houve o incremento de 100 (cem) ações judiciais trabalhista pelo fato de o Reclamado não ter honrado com os compromissos assumidos. Ou seja, além da má-gestão em realizar contratos sem o lastro econômico e financeiro, tornou-se impontual com o seu cumprimento, sendo, assim, temerária a gestão, sob este aspecto, também. Há de se ressaltar, ainda, que diversas dessas reclamatórias possuem valores vultosos, em que os reclamantes tiveram salário aumentado sem nenhum fundamento, ou foram nomeados e contratados por interesse exclusivo do Sr. Itair Machado de Souza e Sr. Wagner Antônio Pires de Sá.
- O ex-Presidente do Reclamado, em aburda atitude, tentou transferir sua gestão ao ex-Vice Presidente, mediante outorga de mandato sem qualquer reserva de poderes, abusando, assim da confiança que lhe foi depositada por ocasião de sua eleição. Esse ato, por sua vez, denota uma ofensa objetiva aos termos estatutários, os quais delimitam e reservam ao Presidente do Reclamado suas atribuições e responsabilidades, as quais, são, pela própria natureza do cargo, indelegáveis e irrenunciáveis;
- Os ex-dirigentes ofenderam os critérios objetivos da Lei da Apfut no mometo que criaram sociedade empresária Futgestão para recebimento de valores pagos pelo Reclamado por suposta prestação de serviços
- O ex-dirigente ITAIR constituiu sociedade empresária, sendo sócio exclusivo com a qual o Reclamado firmou contrato de prestação de serviços. Fato que houve por finalidade fraudar lei imperativa, na medida que o ex-Vice Presidente, recebeu, através de sua PJ, valores a título de contraprestação pela sua atividade de gestor;
- Atestado pelo Conselho Fiscal, conforme Ata de reunião da gestão temerária dos ex-dirigentes;
- Assinaturas de vários contratos pelo ex-dirigente Itair em absoluta afronta às previsões estatutárias;
- Não pagamento de débitos provenientes de aquisição de direitos federativos de atletas gerando diversas ações junto à FIFA com, inclusive penalidade já aplicada na perda de 6 (seis) pontos para o próximo campeonato que disputará na série B
- Os ex-dirigentes do Reclamado firmaram termo de compromisso com o Reclamante visando à assunção de débito junto ao Clube Atlético Mineiro no valor de R$10.000.000,00 (dez milhões dereais) e, para tanto, deram em garantia o penhor dos direitos creditórios que o Reclamado possuía junto à Rede Globo de Televisão. Ocorre que, após o penhor realizado, os ex-dirigentes anteciparam os recebíveis dos referidos direitos dos anos de 2019 até 2022, fraudando, assim o penhor ofertado ao Reclamado que, por sua vez, exige tal direito por força da presente ação judicial.
- Práticas de atos típicos criminosos, como decorrência da gestão temerária por ambos os ex-dirigentes, apurados em inquérito policial e junto ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais
- Procuração que o Wagner Pires outorgou ao Itair Machado como PF e não como PJ que era o contratado.
O que dizem Itair Machado e Wagner Pires
Em contato com a reportagem, Itair Machado afirmou que não tem interesse me assuntos do Cruzeiro, e que o pedido de inclusão de seu nome, e do ex-presidente Wagner, na ação de Fred, seria um ato político do atual mandatário Sérgio Santos Rodrigues. Apesar de afirmar que abriria mão do seu direito de resposta, o ex-dirigente celeste afirmou que havia perseguição de órgãos de imprensa a ele – “vocês querem me sangrar”
– Nada de Cruzeiro me interessa e na hora certa eles vão responder pelos atos deles. Bandido eu não sou não. Agora, toda matéria trabalhista, ele (Sérgio Santos Rodrigues) está pedindo para incluir eu e o Wagner. Isso é ato político. Foda-se para ele, foda-se. Deve estar se divertindo, achando bom (…) É matéria que Cruzeiro entrou pedindo para incluir o Itair? Matéria é você perguntar ao presidente do Cruzeiro (Sérgio Santos Rodrigues) cadê o projeto financeiro dentro do Cruzeiro? Porque vocês não perguntam? Quero ver essa matéria então. O cara não arrumou porra nenhuma pro Cruzeiro. E vocês não fazem matéria…
A reportagem ainda não conseguiu contato com o ex-presidente Wagner Pires de Sá. Assim que for feito, o seu posicionamento será incluído na nota. (Globo Esporte)